Você sabe o que é singularidade?

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Essa semana assisti a uma palestra chamada, vejam só, “O que é singularidade?“; a moça que falava era co-fundadora de um grupo interessado em discutir o assunto. Confesso que a palestra foi muito fraca, a ponto de sair lá sabendo pouco mais do que tinha pesquisado quando me inscrevi, ou seja, quase nada (a própria palestrante deu voltas e admitiu que era um conceito complexo e inconclusivo). Mesmo assim, valeu bastante (ir a palestras sempre vale, mesmo as ruins), pois lá pelas tantas tive uma ideia a partir de um dos slides apresentados.

 

Mas vamos começar do começo.

 

Até onde me lembro, a ideia da singularidade vem lá da ficção científica; é um conceito subjetivo e se refere ao ponto em que a tecnologia atinge um estado-da-arte que permite transformações tão radicais que alteram o destino da humanidade. Exemplos: a viagem no tempo, o teletransporte, os deslocamentos a velocidades maiores que a da luz, a cura para todas as doenças conhecidas, a leitura da mente, os computadores mais inteligentes que o ser humano, robôs com sentimentos, enfim, tudo aquilo que a ficção científica já explorou bastante de maneira competente e fascinante.

 

Mas um dos exemplos que a palestrante usou para exemplificar a ideia foi o da busca da imortalidade e da juventude, senão eterna, pelo menos ampliada em muitos anos.

 

Essa busca foi explorada por escritores em inúmeros textos (uns ótimos, outros nem tanto) de três maneiras clássicas:

 

1. Armazenar as informações da mente de uma pessoa e fazer um “upload” para outro corpo quando essa pessoa morre ou fica gravemente doente. Li uma vez um ótimo livro com esse tema, mas não me lembro o nome. Era sobre um piloto de corrida que tinha morte cerebral em um acidente e um milionário à beira da morte “carregava” as informações do seu cérebro no corpo do jovem. Parece prático, mas os conhecidos do rapaz ficavam desorientados quando o encontravam na rua sabendo que ele tinha morrido. Solução meia-boca com potencial para muito babado, confusão e gritaria.

 

2. Utilizar a criogenia, ou seja, congelar o corpo moribundo em tanques de temperaturas baixíssimas por anos até que a ciência evolua o suficiente para encontrar a cura da doença. Esse método foi largamente explorado na literatura e no cinema; nem duvido que exista de fato (o povo já congela rotineiramente embriões, por que não congelaria o corpo todo?). Também parece prático, mas acordar depois de décadas ou séculos pode trazer alguns problemas de adaptação social bem desagradáveis. Não recomendo.

 

3. Lançar mão de algum método milagroso que combata os efeitos do tempo nesse nosso corpinho tão perecível, tipo tomar banho de formol e livrar-se de todas as rugas e das doenças de velho tão chatas que acometem a todos. Nas histórias, todas as bruxas más adoram. O bom é que tem bastante gente trabalhando nisso, praticamente toda a área de medicina e farmacologia juntas. Tomara que achem esse negócio logo e que ele não dependa de sangue de virgens criadas em masmorras.

 

Foi aí que fiquei pensando. Ok, as pessoas todas querem viver mais. Mas se a gente for olhar, todo mundo desperdiça um monte de tempo fazendo absolutamente nada de útil ou agradável.

 

E a gente admite: está fazendo tal atividade apenas para “matar o tempo”. É um tal de zapear a televisão por horas sem ver nada, fazer palavras cruzadas ou sudoku, brincar com joguinhos (físicos ou virtuais), montar quebra-cabeças, fazer comentários tolos em portais de notícias, roer as unhas; enfim, as possibilidades são infinitas. E o curioso é que quanto mais velha a pessoa é, isto é, teoricamente, com menor estoque ainda disponível, mais quer assassinar frações enormes dessa pobre e infeliz variável chamada tempo.

 

A mente humana é pródiga em criar maneiras de fazer o tempo correr sem que a gente se dê conta; aliás, adoramos isso. A gente até diz que a coisa estava tão boa que nem sentiu o tempo passar.

 

Pense: mas isso não é um paradoxo? Ou seja, detestamos perceber o tempo, queremos sempre que ele flua rápido e imperceptível. Mesmo assim, queremos sempre mais e mais dessa coisa desconfortável que a gente vive tentando se livrar.

 

Muito bem. Mas então a humanidade quer mais tempo para fazer o quê com ele, exatamente?

 

Daí que pensei numa invenção que, essa sim, poderia representar a singularidade em toda sua glória: e se fosse possível armazenar esse tempo de tédio que a gente mata em algum tipo de reservatório para usá-lo depois, quando quisesse ou precisasse?

 

Sei lá, em vez de ficar numa fila de banco sem pensar em nada, e se fosse possível entrar numa cabine e guardar esse tempo lá? Você entra e sai segundos depois; mas no mundo já se passaram horas. Só que essas horas ficam guardadas para você viver depois, mais tarde, quando quiser. Tipo: guardo o tempo que fiquei no consultório médico ou no trânsito e uso depois para fazer uma prova difícil ou numa viagem de férias. Sei lá.

 

Que tal?

 

Bom, eu já tive a ideia, agora é só alguém construir a tal cabine. Fácil, fácil. Tá na mão…

 

PS: Enquanto os técnicos trabalham nisso, convém a gente não ficar desperdiçando muito, né?

 

 

7 Responses

  1. 12 janeiro 2014 at 4:30 pm

    Gostei da viagem. Mas não pode ser uma cabine. Tem de ser algo mais prático, tipo um relógio de pulso. Se você sabe que terá de esperar uma hora numa sala de espera, por exemplo, você simplesmente adianta o relógio em uma hora e zaz: você é chamado imediatamente para a consulta. E ainda fica com um crédito de uma hora guardadinho no seu pulso. Que tal?

    • ligiafascioni
      Responder
      12 janeiro 2014 at 4:42 pm

      Sem dúvida, muuuuito melhor, Ênio!! Vou falar para o pessoal que está desenvolvendo fazer essa alteração no projeto…rsrsrsrs

      Beijocas e obrigada 🙂

  2. clotilde Fascioni
    Responder
    12 janeiro 2014 at 11:10 pm

    Também gostei da idéia, mas o grande lance deve ser exatamente o não fazer nada que não se queira fazer apenas e simplesmente o ócio….mais tempo para nada…

    • ligiafascioni
      Responder
      13 janeiro 2014 at 12:09 pm

      Sim, Clô, mas ócio pressupõe algo agradável. Estava pensando mais no tédio, aqueles momentos que a gente quer matar o tempo. No ócio prazeroso, a gente quer que o tempo dure para sempre….rsrsrsrs

      Beijos <3

  3. Everson
    Responder
    13 janeiro 2014 at 10:42 am

    Geralmente é tido que, em uma sociedade pós-Singularidade, todas as tarefas serão completamente opcionais – basicamente, tudo será feito apenas para “matar tempo”. Junte a isso uma imortalidade funcional e o próprio conceito de tempo perde um pouco o sentido – passa a funcionar apenas para descrever a cadeia de eventos.

    • ligiafascioni
      Responder
      13 janeiro 2014 at 12:08 pm

      Você tem toda razão, Everson, mas estava me referindo ao tédio ou àquele tempo que nos dá a sensação de tê-lo perdido (tipo uma fila de banco).
      Será que algum dia a gente chega lá?
      Abraços e obrigada!

  4. 21 fevereiro 2014 at 10:21 am

    RÁ! Muito bom. Ótima epifania. 🙂

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