O filho perfeito

O primeiro livro que li dessa autora, “A criada”, foi emprestado do meu cabeleireiro (imagina se eu entro num lugar que tem estante e não vou examinar tudo, como se estivesse apreciando a vitrine de uma confeitaria?)… achei o final surpreendente e adorei!
Meses depois, achei o “The perfect son”, de Freida McFadden, num sebo. Não pensei duas vezes.
Se você está pensando em esvaziar a cabeça assistindo uma série na Netflix, faça melhor: leia um livro dessa mulher!
Agora descobri que a linda é médica especializada em lesões cerebrais e já tem quase 20 livros publicados, além de vários prêmios. De fato, ela é muito boa no que faz, viu?
Nessa história, uma mulher tem um casamento bem “família margarina”, se não fosse por um detalhe: desde pequeno, seu filho mais velho apresenta sinais de sociopatia.
Ela fica apavorada desde que, aos 4 anos, ele trancou uma coleguinha num armário com a boca e os membros colados com fita crepe e se recusou a dizer para qualquer pessoa onde a menina desaparecida estava. O menino foi expulso da escola e eles tiveram que se mudar de bairro.
Agora, Liam é um adolescente de 16 anos e se dá super bem com sua irmã Hannah, de 14. Liam é o melhor aluno da escola, participa de competições sobre debates, apresenta-se sempre de maneira impecável, além de ser lindo. Sabe aquele rapaz perfeito demais?
A irmã é uma adolescente comum (das mais chatinhas); reclama de tudo, não é exatamente brilhante na escola, está sempre descabelada e atrasada. Enfim.
Apesar de completamente diferentes, os dois são melhores amigos e estão sempre juntos.
Até que Liam parece apaixonado por uma menina da classe dele; eles se juntam à turma em uma lanchonete e depois ele pega o carro da mãe e vai encontrá-la de madrugada. E essa é a última vez que a menina é vista com vida. A garota simplesmente some.
Liam não demonstra muitas emoções, está sempre no perfeito controle, mas quando a polícia vai até a casa dele, as coisas mudam um pouco.
A irmã e o pai acreditam na inocência dele. A mãe não.
E fica se remoendo internamente por isso. Ela tem muitas evidências de que ele seria capaz disso. Será?
Muita coisa vai acontecendo no caminho. Os capítulos são curtos, cheios de tensão e suspense. Pensa numa autora que sabe fazer seu trabalho direito.
Confesso que não fiquei tão surpresa com o final porque, conhecendo o estilo, começo a desconfiar das coisas mais absurdas. Mas a maneira como ela desenrola tudo e vai encaixando todas as peças no final é admirável.
Um excelente passatempo e ainda melhor se você estiver treinando ler em outro idioma, inclusive porque ainda não saiu em português!
Olha aqui a oportunidade de ler o seu no original, em inglês — é só clicar nesse link da Amazon do Brasil.
Super recomendo!
A menina e a pipa

Mais um livro dessa linda chamada Laetitia Colombani. Quando vi num sebo “Das Mädchen mit dem Drachen”( Tradução livre: “A menina com a pipa”), não pensei duas vezes.
A Laetitia sempre escreve história de amizade entre mulheres, onde homens são meros figurantes. Ela nunca cai na armadilha fácil do romance açucarado. Seu jeito de narrar a história é simples, linear, sem sobressaltos ou surpresas — tranquilidade para quem quer ler em outro idioma; recomendo demais.
Já resenhei aqui duas obras dela: “A trança” e “As vitoriosas”; ambas lidas em alemão; achei bem acessível.
Continue reading “A menina e a pipa”Boas-vindas
A louca dos adesivos ataca novamente e meu hall de entrada está experimentando sua terceira versão, dessa vez com um adesivo mais fácil de tirar sem deixar marcas. Agora estamos mergulhados no azul e fico bem feliz toda vez que chego em casa e vejo esse cenário.
A versão anterior também era adesivada (a moça com binóculo), mas era um adesivo convencional e fez estragos quando retirei (tive que pintar novamente o fundo), além de ficar descolando e enrolando as pontinhas.
A primeira versão foi pintada diretamente nas portas e parede (a trapezista de cabelos coloridos), mas isso não faço mais; depois é complicado para mudar de ideia…rsrs
Divirta-se!
Ela não se sente bem-vinda

Pesquisa aponta as principais dificuldades de integração dos imigrantes no ambiente de trabalho na Alemanha.
Laila veio da Argentina para trabalhar como enfermeira na Alemanha; a promessa de uma nova vida num país tão cheio de cultura era muito excitante, ainda que desafiadora. Ela mergulhou de cabeça no estudo do idioma e estava feliz e curiosa para conhecer os novos colegas. O primeiro choque: eles não pareciam tão felizes assim com a presença dela.
Primeiro foram os comentários sobre o seu sotaque; depois as microagressões, até o sentimento de isolamento, que a faz repensar todos os dias sua decisão.
Essa poderia ser uma história isolada, mas infelizmente reflete as dificuldades de integração de um país que precisa desesperadamente de mão de obra qualificada.
Quem são as Lailas
Com o objetivo de contribuir para mudar esse cenário, o Projeto In Culture, da ONG Janainas, está trabalhando para desenhar soluções que ajudem as muitas Lailas que estão enfrentando desafios no ambiente de trabalho.
O projeto também é focado em seus colegas e chefes, que por conta de vieses inconscientes, podem ter comportamentos que contribuam para o desconforto do time.
Uma equipe desalinhada pode prejudicar a produtividade de todos os integrantes e, em última instância, provocar a perda da mão de obra qualificada que as empresas tanto precisam.
Com o intuito de entender a fundo o problema, o primeiro passo foi fazer uma pesquisa com Lailas — imigrantes que trabalham na Alemanha, independente do gênero e profissão. Também estão previstas entrevistas com o lado dos empregadores e colegas.
O questionário, publicado em grupos e alguns portais cujo público é formado principalmente por imigrantes que trabalham na Alemanha, foi respondido por 92 pessoas de maneira anônima. É importante ressaltar que os resultados não têm validade estatística — a ideia é traçar os contornos do panorama para iniciar o trabalho.
Sabemos também que, por não ter muita penetração entre grupos muçulmanos (a pesquisa foi respondida predominantemente por cristãos ocidentais ) — o viés religioso provavelmente está sub representado nas respostas.
Mas vamos aos resultados.

Percebemos que a maioria dos respondentes são mulheres vindas de países de fora da União Europeia e moram há mais de 7 anos na Alemanha. Todas as pessoas trabalham legalmente no país.
Os maiores desafios
Um pequeno número de entrevistados relatou nunca ter sofrido discriminação ou falou sobre superar o problema buscando ajuda jurídica, mudando de emprego ou se informando sobre regulamentações.
É interessante observar que, mesmo morando há tantos anos no país, mais de 70% ainda têm como maior desafio a barreira do idioma.
Pessoas relatam que deixaram de ser promovidas por não ter um alemão “nativo o suficiente”, mesmo quando a empresa trabalhava 100% em inglês.
Os motivos são vários: o alemão tem uma estrutura gramatical complexa e muito diferente do inglês (atual língua franca no mundo ocidental); além disso, muitas pessoas trabalham em empresas cujo idioma oficial é o inglês. Entrevistados relatam que dificuldades em falar alemão com fluência ou falar com sotaque levaram a julgamentos sobre inteligência ou competência.
Finalmente, a integração com a população local, que facilitaria a obtenção da fluência, é dificultada por diferenças culturais.
Também por causa de vieses (muitas vezes inconscientes), os próximos desafios mais citados são os estereótipos e o preconceito, o que faz com que as habilidades e conhecimentos do trabalhador imigrante não sejam reconhecidos pelos colegas.
As microagressões aparecem com bastante frequência (aqueles comentários maldosos disfarçados de elogios ou mesmo pequenas atitudes ou comportamentos que fazem a pessoa se sentir excluída do grupo). Muitos entrevistados relataram tratamento desigual no trabalho: disparidades salariais, promoções ignoradas, demissões injustificadas e exclusão com base no idioma.
“Já ouvi muitas vezes ‘Você é muito bom para um brasileiro’”.
As diferenças culturais deveriam ser fonte de riqueza, em vez de desafio. Talvez esse aspecto seja a maior oportunidade como veículo de mudança — que todos os envolvidos compreendam a importância das diferenças culturais para o enriquecimento do repertório pessoal de cada profissional com benefícios claros para a empresa.

Sobre a discriminação por gênero, várias respostas mencionam assédio, subestimação ou tratamento injusto por ser mulher, principalmente em áreas dominadas por homens.
Aqui alguns depoimentos anônimos:
“Engravidei e os supervisores queriam encerrar meu projeto e me mandar de volta para o Brasil.” – um exemplo pungente de discriminação de gênero e nacionalidade.
“Avaliações de desempenho… meu feedback é que preciso sorrir mais.” – um exemplo de microagressão sutil.
“Um colega de trabalho me assediou moral e sexualmente… disse coisas como: ‘você é burra, mas cheira muito bem.’” – um relato perturbador de abuso no local de trabalho.
“Quando fui contratada, achei que minha oferta salarial era justa, mas depois de entrar na empresa percebi que era muito menor do que a dos meus colegas alemães/homens para a mesma função e nível de senioridade.” – um exemplo de disparidade salarial entre nativos e imigrantes.
“Homens alemães muito menos qualificados ou competentes do que eu… ganham mais… enquanto eu tenho sido constantemente impedida de obter uma promoção.” – um reflexo de preconceito de gênero e raça agravados.
O quadro seguinte resume os temas, número de menções e exemplos de respostas.

Em resumo, os dados mostram que a origem étnica/nacionalidade é consistentemente uma das formas de discriminação mais relatadas. E também:
- A discriminação baseada em gênero frequentemente se cruza com a discriminação baseada em origem étnica/nacionalidade.
- A discriminação relacionada à idade aparece como um fator significativo, especialmente quando combinada com outras formas de discriminação.
- Os resultados sugerem que a discriminação baseada em origem étnica/nacionalidade é a forma mais prevalente em diferentes grupos demográficos, frequentemente ocorrendo em combinação com outras formas de discriminação, como gênero e idade.
Sentimentos e percepções
O tom das perguntas abertas, onde os respondentes podiam compartilhar casos pessoais, dá uma ideia do tipo de sentimento compartilhado por esses trabalhadores.

Onde encontrar apoio?
Em relação à busca por apoio, tanto o departamento de RH, como chefias e políticas institucionais, são vistas como ineficazes ou omissas frente às denúncias.
Há muitos casos de retaliação ou isolamento após denúncia de discriminação. Algumas pessoas buscaram apoio jurídico, documentaram os abusos ou confrontaram verbalmente os ofensores.

As principais estratégias utilizadas, principalmente entre mulheres, são alianças com outros imigrantes ou grupos vulneráveis, especialmente em grupos online (redes sociais).
Muitos relataram que estruturas como RH, chefia ou políticas de diversidade falharam em oferecer suporte real. Embora alguns tenham participado de ERGs (Employee Resource Groups), muitos os consideraram superficiais ou ineficazes.
“Meu chefe sugeriu uma ‘Sessão de diversidade’ — o que só fez as coisas piorarem“
Em resumo:
- Estruturas formais (RH, DEI) são frequentemente ineficazes, levando os funcionários a confiarem em redes informais com colegas em situações semelhantes.
- Muitos experimentam isolamento, seja por ambientes hostis, falta de diversidade ou medo de retaliação (“Evite alemães”, “Fique quieto”).
- Estratégias de enfrentamento variam: alguns buscam alianças, outros optam por adaptação passiva ou deixam o emprego.
- Críticas ao performativismo corporativo: iniciativas de diversidade existem, mas falham em proteger ou incluir de verdade.
Conclusões
A pesquisa forneceu muito material, com fartos exemplos, que nos proporcionou a oportunidade de ter uma ideia mais aproximada da real situação. Alguns insights que pudemos inferir:
- Apoio real vem de pares, não de sistemas
- Redes informais (outros imigrantes, mulheres, POCs) são a principal fonte de suporte, não as estruturas corporativas.
- Ambientes tóxicos levam ao êxodo
- Quando a discriminação persiste, a saída é muitas vezes a única solução viável.
- Necessidade de mudança estrutural
- Empresas precisam ir além de “performar” diversidade e garantir mecanismos reais de proteção e inclusão.
- Resiliência ≠ Solução
- Exigir que minorias “se adaptem” ou “aguentem” ignora a responsabilidade das organizações em combater vieses.
Os próximos passos para a elaboração de uma proposta de solução ainda estão em andamento, mas algumas ideias preliminares já podem ser consideradas, com base nas conclusões do estudo.
- Criar redes de apoio autogeridas (ex.: grupos de imigrantes com patrocínio da empresa, mas com independência).
- Treinar líderes em viés inconsciente com foco em consequências reais e exercícios práticos no dia-a-dia (não apenas teoria).
- Estabelecer canais anônimos de denúncia com investigações externas para evitar retaliação.
Esse testemunho traz uma forte visão do trabalhador imigrante na Alemanha:
“Entenda que nem tudo é pessoal, que as estruturas racistas e coloniais vigentes são maiores que você e existem há mais tempo, e que, por causa da forma como isso o afeta, você não deve se comparar aos nativos. Lembre-se da sua história e do quanto você já evoluiu.”
E esse outro também apresenta um ponto a considerar:
“Há mais alemães legais do que idiotas, assim como em todos os países.“
Ainda temos um longo caminho pela frente, mas identificar corretamente o problema é certamente um passo importante e decisivo.
Acreditamos que a consciência e admissão da existência dessas questões ajudará muito as empresas a não perder recursos humanos preciosos e cada vez mais escassos (mão de obra qualificada), além de aumentar a produtividade, reduzir a rotatividade de empregados e aprimorar a capacidade de inovação, que depende em grande parte do nível de diversidade do time.
E mais do que tudo, estamos trabalhando para que Laila não se arrependa da decisão que tomou ao vir trabalhar na Alemanha, e que seus colegas a acolham e reconheçam a importância e o valor do seu trabalho.
Se você quiser ficar atualizado sobre os desdobramentos e ações desse projeto, acompanhe o blog do site Janainas.
[NOTA: Esse artigo foi elaborado por Ligia Fascioni com a colaboração de Evelyne Leandro e Livia Rangel]
A entrevista

Estou com vários livros técnicos para ler e um monte de trabalho para fazer, então fiquei muito tentada ao achar “The interview” (tradução livre: “A entrevista”), de C. M. Ewan. Parecia um thriller cheio de ação e emoção, desses que a gente devora sem pensar muito.
E era.
Depois desse livro, por pior que tenha sido a sua pior entrevista de emprego, nada vai se comparar a isso.
Continue reading “A entrevista”Troll

Estava, para variar, visitando um sebo (essa cidade é o paraíso!), quando me deparei com “Troll: a love story“, de Johanna Sinisalo. A capa era instigante e não batia com “uma história de amor” do título (ainda bem, pois não tenho paciência com mocinhos e mocinhas apaixonados).
Lendo a quarta capa, a coisa ficou mais interessante. A autora, uma finlandesa, tem outros livros publicados e já ganhou vários prêmios, e o resumo da história prometia. Resolvi levar. Que bom!
Continue reading “Troll”PORQUE A DIVERSIDADE É ESSENCIAL PARA A INOVAÇÃO

NÃO PENSE QUE PORQUE AGORA TEMOS INTELIGÊNCIA ARTIFICIAL GENERATIVA, OS PRINCÍPIOS DA INOVAÇÃO MUDARAM; ELES CONTINUAM OS MESMOS, E MAIS IMPORTANTES DO QUE NUNCA.
Se tem um elemento fundamental para a inovação acontecer (apesar de não ser único e nem suficiente) é a capacidade de gerar ideias inusitadas, originais, inéditas e em profusão.
Pois justamente a essa altura, quando a gente está bem no meio de um dos momentos mais revolucionários da história da humanidade, nunca precisamos tanto de ideias, principalmente as inusitadas, originais, inéditas e em profusão.
INTELIGÊNCIA ARTIFICIAL RESOLVE TUDO?
A questão a inteligência artificial generativa está permeando nossa vida pessoal e profissional de um jeito que é impossível ignorar. Ao mesmo tempo, a gente está experimentando as consequências de mudanças climáticas graves e cada vez mais intensas, que estão colocando em risco nossa permanência no planeta.
Continue reading “PORQUE A DIVERSIDADE É ESSENCIAL PARA A INOVAÇÃO”Um longo caminho para um pequeno planeta raivoso

Como um livro com um título tão curioso veio parar na minha mão? Eu super evito entrar na livraria Dussmann (a maior aqui de Berlim), com seus 5 andares de tentações; mas o prédio anexo com 2 andares só com livros em inglês, que me salvou nos primeiros anos aqui, exerce uma atração irresistível nessa pessoa que vos escreve.
A ideia era só passear, mas quando vi a estante de lançamentos de ficção científica com “The long way to a small angry planet“, de Becky Chambers, em destaque, ficou difícil. Ainda mais que, no canto superior esquerdo da capa tinha um selo indicando que a obra ganhou o Prêmio Hugo como melhor série (sim, tem outros volumes). Fazer o quê, né? Vocês estão de prova que era inútil resistir…
Continue reading “Um longo caminho para um pequeno planeta raivoso”As 5 lições que aprendi com os incompetentes motivados

Aqui compartilho a experiência de usar IAs generativas para ajudar a fazer a análise dados de uma pesquisa. O resultado, mesmo impressionante, pode surpreender negativamente. A chave está em entender como essas ferramentas “pensam”.
Disclaimer: Esse artigo é direcionado a pessoas leigas e usuários comuns; não especialistas e profissionais no uso das ferramentas de IA generativas.
Continue reading “As 5 lições que aprendi com os incompetentes motivados”Desobediência

Achei “Disobedience”, de Naomi Alderman, num sebo em Londres (desculpa, mas sou chique! Hahaha…). Eu já tinha lido “The Power”e “The Lessons” (esse eu nem me lembrava, vi agora que nem fiz a resenha).
O livro foi publicado em 2006 (foi o primeiro dela) e ganhou vários prêmios, além de críticas elogiosas. De fato, é muito bem escrito.
Continue reading “Desobediência”
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