Minha história com o alemão…

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Há dois anos, quando me mudei para Berlin, a única coisa que eu sabia em alemão era contar até 10 (e mesmo assim, ninguém entendia a minha pronúncia). De lá pra cá, já aprendi bastante coisa e até consigo me virar no dia-a-dia, mas ainda estou bem longe de poder colocar no currículo que sou fluente no idioma de Goethe (mais ou menos uns 30 anos longe, vá lá…rsrsr).

Decidi compartilhar minha história de aprendizado porque pode ser útil para alguém.

Bom, a primeira providência foi me matricular numa escola. Foi-nos recomendada uma que era considerada das melhores, a GLS — German Language School; era caríssima, mas eu precisava muito aprender a língua, pois queria começar a trabalhar logo. Imagina a inocência da pessoa, achar que alemão se aprende assim, rapidinho, que nem espanhol ou inglês.

Eis que a escola era toda voltada a estrangeiros que queriam passar algumas semanas em Berlin estudando a língua. Lá era maravilhoso: tinha hotel, passeios, excursões, festas, etc. Quer passar uma semana em Berlin dando um “tapa” no alemão (que você já estuda há algum tempo) e de quebra ampliar seu círculo de contato com pessoas do mundo todo? Lá é o lugar (recomendo muito!). Mas quer aprender alemão do zero e sair falando? Não vá (aliás, agarre bem sua carteira e saia correndo).

É o seguinte: como os cursos são cobrados por semana e as turmas são organizadas da mesma maneira, na real não existe uma estrutura para quem quer aprender de verdade. A pessoa faz um teste para ver onde se encaixa e a cada semana vai mudando de turma (às vezes de professor também), já que é um entra-e-sai danado. O problema é o ritmo é acelerado demais para quem está vendo tudo pela primeira vez: a turma faz um jogo, brincadeira ou exercício sobre o tema e pronto, o assunto é dado por encerrado — vamos para o próximo). Não há nada de errado nisso porque o conceito é revisar, não aprender. A questão é que depois de um mês lá estava eu na mesma sala que suíços e holandeses que estudavam a língua desde os 6 anos de idade; aí fica complicado…

Como não tinha prova (e raramente lição de casa), fui passando automaticamente e, quando vi, em apenas 5 meses de aula já estava nível C1 (só para se ter uma ideia, no nível C1 a pessoa fala como um nativo e pode cursar a universidade). Obviamente não tive tempo nem de entender direito o que se passava, minha cabeça era pura confusão; o professor explicava (em alemão, claro) porque o genitivo tem que vir após a conjunção adverbial e eu apenas tentava desesperadamente entender as palavras escritas no quadro. Apesar dos pesares, as turmas semanais eram uma boa para quem viajava várias vezes ao Brasil, como eu. Assim não perdia nenhuma aula, eles sempre me encaixavam em algum lugar quando eu voltava.

Como sempre fui muito participativa na sala, vivia levando puxão de orelha porque uma pessoa “no meu nível” não podia estar cometendo o tipo de erro que eu fazia quando tentava falar. Caracas, mas foram eles que me colocaram naquele “nível”, não fui eu que escolhi. Acabava voltando e repetindo algumas lições em outra turma, mas não adiantava muito — como a estrutura de ensino não existia, era como se eu estivesse fazendo outro curso, completamente diferente, só que com outro professor. Alguns eram ótimos, outros nem vou comentar. Como em qualquer escola, enfim.

Aos poucos, minha auto-estima foi sendo minada e comecei a me sentir um pouco burra; falar alemão fluente (e com as declinações corretas) em apenas 6 meses estava muito além da minha capacidade. Finalmente comecei a entender como é que que os alunos que tiravam notas baixas se sentiam (nunca imaginei isso, é uma sensação muito ruim mesmo). O pior é que minha maior dificuldade era justamente redação, parte que sempre gostei; o alemão tem uma forma completamente diferente de estruturar uma frase e eu sempre montava tudo errado, pois não conseguia entender a lógica do negócio.

Bom, depois de um ano de tortura achando que tinha emburrecido ou que estava velha demais para aprender uma língua, entre várias outras especulações, comecei a conhecer mais pessoas com o mesmo problema que eu. Começa que não consegui conhecer ninguém que tivesse ficado fluente em alemão em apenas 6 meses. Tinha alguma coisa errada aí…

Pesquisei um pouco mais e descobri que num curso convencional se leva de dois a três anos para chegar no nível em que eu cheguei aos 5 meses (com a mesma carga horária por semana); não me admira que não conseguisse acompanhar.

Foi aí que resolvi me matricular numa escola comunitária (as chamadas “Volkshochschule“) e o mundo voltou a ser como era antes; eu conseguindo acompanhar a aula bem direitinho. Adoro o professor, que é exigente, metódico, detalhista e enche a gente de lição de casa (e cobra); nada de joguinhos e brincadeiras onde a gente se diverte mas não entende direito o que está acontecendo. Sou engenheira, preciso de método e estrutura para aprender, ainda mais uma coisa tão intrincada como é a gramática dessa língua. Finalmente encontrei o que precisava numa escola que custa pelo curso inteiro de 3 meses menos do que a outra custava por semana!

Fiz um teste para entrar e acabei ficando no nível B1.2 (fiz esse nível no começo desse ano, depois o B1+ que durou 3 meses e agora estou no B2.1 que vai durar mais 3 meses). Claro que acabei perdendo muita coisa porque fiz os níveis básicos mal e porcamente; até hoje essa falta aparece na minha redação, mas aos poucos vou recuperando o tempo perdido (já que o dinheiro não tem mais jeito mesmo…rsrsr).

Já perdi a ilusão de que vou estar falando que nem os nativos daqui a um ano ou dois. Sim, conheço gente que conseguiu aprender a se virar bem em 2 anos, mas essas pessoas não escreviam todos os dias em português e, na maior parte dos casos, eram casadas com alemães. Também conviviam com a família do marido e muitas não tinham nem internet quando vieram, ou seja, estavam realmente imersas, que não é meu caso. Ah, e é claro, nenhuma tinha 45 anos quando começou a aprender….

Enfim, terei que ter um pouco mais de paciência, pois o idioma oficial em casa é o português (já tentamos, mas a conversa nunca ultrapassa 15 minutos de banalidades…rsrsrsr) e não quero deixar de fazer a coisa que mais gosto, que é escrever em português.

Como adoro assistir aulas desde que me conheço por gente (adorava mesmo na outra escola), isso não vai ser um grande problema; por mim passo o resto da vida frequentando escolas. Também faço tandem (conversa em português e alemão com algum nativo) quando dá e tento ler jornais e revistas (além da TV). Além disso, estou fazendo um esforço para só ler livros em alemão (e em inglês, para não esquecer).

Mas vou dizer, o negócio demora, viu?

O que vale é que sou brasileira, e vocês sabem, a gente não desiste nunca…

***

NOTA: Para quem tem interesse em estudar numa Volkshochschule, aqui tem o link para as escolas de Berlim, mas praticamente toda cidade alemã tem pelo menos uma (em Berlim são 12 unidades). Também tem um texto aqui que explica os outros cursos que eles oferecem.

15 Responses

  1. 23 agosto 2013 at 2:27 pm

    É Lígia, não desista, eu tenho que tomar vergonha na cara e começar a aprender de verdade uma outra língua, a gente fica empurrando com a barriga, adiando, cancelando cursos e daí quando vai ver já passou muito tempo, é o que está acontecendo comigo, mas já determinei que daqui pro final do ano vou me dedicar a estudar mais.

  2. 23 agosto 2013 at 10:44 pm

    Ligia, Curti seu comentário/texto, pois aconteceu algo semelhante comigo. Fiz uns cursos aqui no Brasil mas só fui para a Alemanha dois anos depois. Foi uma imersão desesperadora no inicio. Fui sozinho, o português só falava sozinho. Todos só falavam alemão, poucos o inglês. Tive que me virar. A sorte é que fui para uma Volkshochschule direto, arrumei uma namorada alemã e no escritório que trabalhava e na escola onde estudava só se falava alemão. Do desespêro inicial migrei rapidamente para falar um alemão intuitivo que é o que falo e escrevo até hoje. Não me importo com os erros. Em quatro meses meu HD recuperou tudo o que tinha aprendido antes e acumulou um vocabulário razoável, ao ponto que me designaram para comandar operários alemães em uma feira no sul. Foi uma pauleira. Entendo o seu relato, pois tem horas que a auto estima vira frangalhos fácil fácil! A parte mais agradável foi a com a namorada, mas isso você não pode fazer. De resto boa sorte!

    • ligiafascioni
      Responder
      24 agosto 2013 at 8:57 am

      Oi, Freddy!

      A imersão é desesperadora, mas acelera incrivelmente o aprendizado. Eu não passei por isso, talvez seja o motivo de estar aprendendo mais devagar. Sem falar da namorada, né? Pois é, mas vou ter que ficar assistindo aula, pois as alemãs não fazem muito o meu tipo (vou ter que usar o método convencional mesmo….ahahahaahahahahahahah)…

      Beijocas e obrigada por compartilhar sua experiência também 🙂

  3. clotilde Fascioni
    Responder
    23 agosto 2013 at 11:19 pm

    Força na peruca guria!

  4. 25 agosto 2013 at 6:52 pm

    Oi Lígia.
    Você poderia nos passar os contatos (site, emails, telefones e etc) dessa escola comunitária?
    Tenho uma amiga que também estudou na GLS e não gostou.
    Ela acabou indo pra UNS, que fica em Hamburg.
    Sucesso.

    • ligiafascioni
      Responder
      26 agosto 2013 at 11:00 am

      Oi, Theo!

      Existem dessas escolas em todas as cidades da Alemanha, inclusive em Hamburgo. Aqui está o link para a escola de Hamburgo (http://www.vhs-hamburg.de) e aqui o link para as escolas de Berlin que são várias, pois tem pelo menos uma em cada bairro (http://www.berlin.de/vhs/).
      Abraços e sucesso para sua amiga!

  5. Celia Miranda
    Responder
    18 fevereiro 2014 at 5:44 am

    Soube de ti, Lígia, através do Blog da Cris Guerra, que leio com frequência, e vendo uma fotos feitas por você, lindas demais, fiquei curiosa de saber mais a seu respeito.
    E acabo de ler seu relato sobre as primeiras experiências com o idioma Alemão, dei umas boas risadas, mas me identifiquei também. Estou há dois anos, numa pequena cidade, Visbek, próxima a Bremen, fiz o curso de Integração, passei nas provas e tal, e agora busco um novo curso pra dar continuidade ao aprendizado. Um desafio só menso difícil que a maternidade, e como tenho um casal de filhos, com 7 e 6 anos, e também a mesma idade que você, andei me achando burra – ou louca – por meses a fio! Agora, te lendo vejo que sentir-se assim faz parte do processo! Então, me reanimei e vou me empenhar ainda mais pra correr atrás da fluência na língua. Valeu, um beijo e continuarei lendo suas postagens!

    • ligiafascioni
      Responder
      18 fevereiro 2014 at 5:46 am

      Nossa, que bom que não sou a única, Celia! Mas seus filhos já devem estar dando um banho no idioma (crianças aprendem muito rápido), o que facilita o aprendizado, pois você pode conversar com eles nessa língua e eles podem até corrigir você…rsrsrs
      Danke und viel Glück 🙂

      PS: Também amo o blog da Cris Guerra <3

  6. 25 outubro 2014 at 7:27 pm

    Ei Lígia!
    Nossa isso que você disse de que “o alemão tem uma forma completamente diferente de estruturar uma frase” é muito verdade, e até a gente começar a pegar o embalo da linguá demora muito mesmo. E ao mesmo tempo é interessante esse diferencial da linguá os casos e casos e casos e tudo mais. Penso que é aos poucos mesmo e o mais legal e o desafio de aprender. Bom as vezes em certos idiomas, penso que parece existir certos mitos e assombrações em volta do idioma, como é o caso do alemão. Por exemplo, no universo dos estudos da filosofia principalmente na area da estética, onde para se compreender melhor um texto sobre estética saber alemão conta bastante, as pessoas que estudam lhe dão a entender que o alemão é incompreensível e de que você não terá a capacidade de aprender. Mas o importante é ultrapassar essas barreiras mitologicas da linguá né que os outros criam para te limitar e continuar a estudar igualzinho do jeito que você fez. 🙂 Obrigada querida por dividir sua experiencia um beijo no <3 e tudo de bom.

    • ligiafascioni
      Responder
      27 outubro 2014 at 4:29 pm

      Ich versuche es, süße Franz <3
      Vielen Dank 🙂

  7. Elieth
    Responder
    27 julho 2015 at 3:12 pm

    Eu recomendo para quem ainda está no Brasil procurar o instituto goethe. 😉

  8. Marcelo
    Responder
    7 novembro 2015 at 12:08 pm

    Oi Ligia, estou muito interessado em ir morar na Alemanha, mas claro tem muito pra chegar ai, atualmente trabalho em uma empresa aqui no Brasil que tem uma filial em Frankfurt, irei ver como faço para chegar ai, mas a principío pretendo estudar alemão aqui no Goethe. Mas se não der certo por onde trabalho pretendo tentar pela área de formação que é TI. Não sei como está o mercado para TI na Alemanha mas também não deixa de ser uma alternativa. Adorei seu blog, pois ele está sendo muito bom para me orientar e trilhar meu caminho para tentar minha vida ai na Alemanha.

  9. Carolina Cardozo
    Responder
    3 janeiro 2016 at 7:15 pm

    Olá Lígia! Serei muito sincera, ainda não conhecia seu blog. Li hoje pela primeira vez esse texto que pulo na minha frente ao digitar desesperadamente no Google: “quanto tempo aprender alemão fluente”! Pois é, confesso que está batendo um desespero. Também não sou mais nenhuma mocinha, já tenho 36 anos e estou aqui na Alemanha há um ano e 3 meses. Desde que cheguei estudo praticamente todos os dias. Com exceção de uma época em que fiquei 4-5 meses sem ter aulas, entre o nível B 1.2 e o B 2.1 (meu nível atual). E mesmo assim não estou feliz com meu nível. E tenho no máximo até setembro para alcançar o C 1 para poder começar o meu mestrado. Do contrário precisarei voltar para o Brasil…
    Enfim, bateu o desespero. E ao encontrar seu texto, fiquei imaginando como você está agora. Quer dizer, você escreveu seu depoimento em 2013 e já estamos em 2016. Queria saber como foi depois. Se você continuou estudando e, se sim, como foi o processo até que você se considerasse fluente ou pelo menos capaz de fazer coisas que só quem tem segurança na língua faz. Será que você poderia gastar 5 minutinhos do seu tempo para dar um breve relato? Ficaria muito agradecida e feliz em ouvir. Estou precisando de motivação seja para ficar, seja para voltar para a Terrinha.
    Muito obrigada!

    • ligiafascioni
      Responder
      5 janeiro 2016 at 7:26 am

      Oi, Carolina!
      Realmente, você tem um grande desafio, mas conheço gente que conseguiu! Tenho certeza que será o seu caso.
      Eu fiz a prova do B1 e obtive a certificação, cheguei a cursar o B2, mas não fiz a prova. De fato, consigo me comunicar, mas estou longe de ser fluente (fico procurando as palavras e ainda cometo muitos erros). Mas parte do problema é minha falta de dedicação (escrevo todos os dias em português por conta do meu trabalho, viajo muito ao Brasil) e parte por falta de contato com a língua (trabalho o dia todo numa empresa de tecnologia com meu marido; como somos só nós dois, e ele também é brasileiro, acabamos falando português – minha esperança é que consigamos contratar funcionários alemães em breve e eu seja forçada a falar a língua). Nesse início de ano tenho intenção de retomar as aulas a partir do B2 (vou repetir o módulo todo, assim revejo alguns tópicos e tenho oportunidade de ter contato com a língua todos os dias).
      O que eu faço é não ler mais em português, somente em inglês (para não esquecer) e alemão. Estou conseguindo manter uma média de 3 livros a cada duas semanas, mas sei que não é o suficiente. Consigo resolver os problemas do dia-a-dia (marcar médico, dentista, etc), mas, como disse, estou longe de ser fluente (falar sem pensar antes).
      Seu caso é diferente do meu, você está com dedicação exclusiva e estudando bastante. Vai conseguir sim!!!
      Abraços e sucesso 🙂

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