Recebi uma demanda para fazer alguns vídeos sobre o Líder 5.0 (que bom, há empresas que continuam investindo forte na equipe!) e me dei conta que o livro que deu origem ao termo, Good to be Great1, do Jim Collins, já estava na minha lista de resenhas a serem feitas há meses (a pilha só faz crescer!). Bem, não vai ser dessa vez ainda que vou resenhar o livro, pois vamos falar aqui apenas de um dos conceitos apresentados: esse tal de Líder 5.0!
Tudo começou depois que Collins publicou Built to Last2, contando sobre o que as empresas duradouras têm em comum. Num jantar de negócios, um dos convidados criticou o livro dizendo que essas empresas que duravam sempre foram excelentes; ele acharia mais interessante descobrir como empresas boas se tornaram ótimas, realmente notáveis. A maioria continuava boa para o resto da vida; raras eram as que davam o salto para a categoria sensacional.
Apesar de pessoalmente não achar nada errado em ser bom para o resto da vida (que maravilha se a maioria fosse assim), também não vejo nenhum problema em alguém querer extrapolar esses limites e se tornar referência. Collins aceitou a provocação e colocou sua equipe de 21 pesquisadores para trabalhar duro por cinco anos.
Eles se surpreenderam com os resultados, mas vou me concentrar aqui no que encontraram sobre liderança, que, de início, não era um tema que estavam analisando. Pelo contrário.
Critérios
Bom, o primeiro passo era definir “ótima” no universo das empresas. A equipe escolheu aquelas que conseguiram aumentar em no mínimo três vezes o retorno cumulativo de suas ações em relação à média do mercado e conseguiram manter esse índice mesmo após 15 anos do que Collins definiu como o momento de transição do bom para o excelente. A menos bem sucedida ficou 3.42 vezes acima da média; a campeã chegou a superar o índice em 18.5 vezes!
Sim, o critério foi apenas do ponto de vista financeiro. Mas vá lá.
Um cuidado importante que eles tomaram: nesse período, os dirigentes da empresa deveriam também ter mudado. Eles usaram isso para diferenciar empresas excelentes daquelas que apenas calharam de ter líderes excelentes. O tempo de 15 anos também anularia a questão sorte (ninguém tem apenas sorte por 15 anos seguidos). Havia outras condições de contorno, mas no final, encontraram 11 empresas que cumpriam todos os requisitos. Para o espanto de todos, nenhuma delas era uma das famosas gigantes que eles estavam, de certa forma, esperando.
Surpresas
Mergulhando fundo num oceano de artigos e entrevistas é que eles acabaram descobrindo, por extensão, que essas empresas tiveram líderes muito especiais a partir do momento de transição.
A maior surpresa que a equipe teve é que esses líderes eram muito discretos; ninguém tinha ouvido falar deles. Nada parecido com os popstars que costumam frequentar as capas das revistas de negócios.
A maioria era bem reservada, quieta e alguns que poderiam ser classificados até como tímidos. Porém, todos possuíam uma força de vontade, uma obstinação e uma determinação em fazer as coisas funcionarem aparentemente inesgotáveis.
Outra coisa: antes de começar a transição, esses líderes procuraram as melhores pessoas e as substituíram pelas que estavam no lugar errado na empresa. Como eles bem definiram: as pessoas não são o ativo mais importante da empresa. As pessoas certas são.
A analogia é que o líder (motorista) precisa tirar as pessoas que não deviam estar no ônibus e embarcar as pessoas certas. Depois é que, com a ajuda delas, se define o destino e o caminho. Achei inteligente.
Quem é esse Líder 5.0?
Aliás, inteligência é o que define o líder 5.0. Ele sabe que não sabe, e isso é essencial. Ele valoriza a ajuda e não toma todo o mérito para si.
Aliás, o ponto comum em todas as entrevistas é que eles nunca se achavam os responsáveis pelo sucesso da empresa; a maioria definia o resultado como a sorte de ter podido contar com condições favoráveis e pessoas competentes.
Ao contrário dos líderes de nível mais baixo, um Líder 5.0 assume toda a responsabilidade pelos erros de sua equipe (que os autores chamam de olhar no espelho) em vez de tentar encontrar culpados fora (olhar pela janela).
Tem uma frase de Harry Truman que penso resumir bem a questão:
“Você pode conquistar quase tudo na vida, desde que não se preocupe com quem fica com os créditos”
É isso. O Líder 5.0 não está preocupado com os créditos. Ele não é movido pelo ego, não busca o glamour e nem sonha em ser capa de revista. Ele quer que a empresa seja maior que ele. Ele quer poder dizer, com orgulho: “eu já trabalhei nessa empresa”.
E os outros níveis?
Ok, estamos aqui discorrendo sobre o Líder 5.0, mas quais seriam os quatro primeiros níveis?
Vamos lá:
Líder 1.0: O INDIVÍDUO ALTAMENTE CAPAZ
É o profissional competente, talentoso, cheio de habilidades, com hábitos de trabalho saudáveis e que traz sempre contribuições de valor.
Líder 2.0: O MEMBRO QUE CONTRIBUI
É o profissional que é ótimo para trabalhar em equipe; oferece toda a sua competência para combinar com os outros membros e atingir os objetivos da empresa.
Líder 3.0: GESTOR COMPETENTE
Ele consegue organizar as pessoas e os recursos de maneira eficiente para conseguir resultados.
Líder 4.0 O LÍDER EFETIVO
É aquela pessoa que inspira; é comprometido, tem uma visão clara e consegue estimular padrões de desempenho mais altos que a média.
Líder 5.0: O EXECUTIVO
Essa pessoa reúne todas as capacidades citadas anteriormente e adiciona mais duas: a MODÉSTIA (não gosto da palavra humildade, que o autor prefere usar, pois para mim ela está muito associada à inferiorização, desvalorização, submissão) e a DETERMINAÇÃO PROFISSIONAL.
A discrição como base
O Líder 5.0 prefere não falar sobre si mesmo; ele sempre desvia o assunto para a equipe e seus méritos, quando perguntado. Os profissionais entrevistados sempre diziam que a empresa tinha gente mais competente que ele e que estava tentando dar o seu melhor.
Por causa dessa atitude, talvez, esses líderes formam sempre sucessores competentes. Eles nunca se sentem ameaçados; pelo contrário. Acham mais seguro ter gente brilhante por perto, pois seu foco, não esqueçamos, não é a fama e o reconhecimento, mas os resultados da empresa.
Bom, e aqueles líderes famosos que vivem nas capas das revistas? Os autores falam sobre Jack Welch, a lenda da General Electric. Apesar de toda aquele auê, a empresa não chegou nem perto do resultado dessas 11 estudadas. A Circuit City, que ninguém ouviu falar, deu resultados proporcionais 6 vezes maiores que a GE entre 1981 e 2000.
Lee Iacocca, o celebrado CEO da Chrysler, passava boa parte do tempo se autopromovendo. De comerciais de TV a programas de auditório, ele viajou o mundo divulgando sua biografia. Seu ego fez com que a empresa dependesse totalmente dele; ficou o máximo de tempo que podia e exigiu tratamento de celebridade quando saiu. A empresa conseguiu se manter por algum tempo, mas acabou sendo vendida para a Daimler-Benz.
Iacocca era um Líder 4.0: competente, carismático e inspirador. Mas quis ser maior que a empresa, o que a tornou não sustentável.
Prata da casa
Outra coisa interessante que os pesquisadores observaram: os líderes 5.0 geralmente vêm de dentro da própria empresa, não de fora. As evidências mostram que trazer alguém de fora para chacoalhar a estrutura e resolver todos os problemas pode ser muito arriscada, principalmente ao contratar uma estrela.
Das 11 empresas excelentes que fizeram parte do estudo, 10 tiveram seus CEOs criados e nutridos dentro da própria equipe interna; desses, três eram herdeiros do grupo familiar. Nesse caso, santo de casa faz milagre sim!
Mas como se tornar um líder 5.0?
Segundo os autores, existem pessoas para as quais o ego é algo extremamente frágil; fama, fortuna e poder são seus objetivos de vida. Essas nunca se tornarão líderes 5.0.
Mas a grande maioria, na opinião deles, consegue ver o futuro muito maior que apenas um indivíduo; deseja ver algo que dure e faça diferença para os outros.
Para chegar no nível 5.0, é claro que se precisa de muito estudo e preparação com relação aos quesitos anteriores. Mas o que os candidatos precisam mesmo é de auto-reflexão, auto-conhecimento, a consciência da necessidade do desenvolvimento pessoal, um mentor, um grande professor, parentes e amigos amorosos, apoiadores, uma vida significativa e, principalmente, muita vontade.
Para fechar, fiquei pensando aqui em quem eu conheço que poderia ser considerado um Líder 5.0.
Sou uma baita sortuda, pois cheguei em dois nomes de amigos queridíssimos: o Diego Trávez (meu agente, dono da DMT Palestras) e o Tio Flávio (do sensacional projeto Tio Flávio Cultural).
Das pessoas que nunca conheci pessoalmente, acredito que apenas a Luiza Trajano (Magazine Luiza) parece ter o perfil.
E você? Conhece algum Líder 5.0?
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1 A tradução literal de “Good to be Great” é “Boas para serem ótimas”, mas no Brasil o livro saiu com o título “Empresas feitas para vencer”
2 No Brasil saiu como “Feitas para durar”.
ÊNIO PADILHA
No Brasil consigo pensar em duas pessoas (além da Luiza Trajano, por quem tenho grande admiração): o empresário Ricardo Semler (ele escreveu, nos anos 1980, um livro sensacional chamado VIRANDO A PRÓPRIA MESA) e o (já falecido) Comandante Rolim Amaro, presidente da TAM.
ligiafascioni
Boa lembrança do Ricardo Semler; é que nunca mais ouvi falar dele (dei uma olhada, ele se mudou para os EUA). Li vários livro dele e estou surpresa de não ter encontrado nenhuma resenha aqui no blog (que tenho certeza que escrevi; como pode?). Enfim, obrigada pela lembrança! Sobre o comandante Rolim, sei muito pouco sobre ele, mas a empresa mudou muito depois que ele se foi; um líder 5.0 sempre deixa os próximos líderes prontos para assumir… então não sei…
José-Eduardo Avila
Herr Fascioni, gunten abend! Gostei imensamente do artigo, principalmente pelo fato de ser narrado pela ótica do “Dono”!?. Sua observação de que humilde não faz sentido no caso, preferindo o modesto, foi pertinente. Tudo o mais do artigo faz sentido, observando-se o objetivo a se alcança-lo, modestamente auspicioso.!? Aufidezen
ligiafascioni
Que bom que não sou a única que se incomoda com essa palavra…rsrs… e que bom que o artigo atendeu os objetivos! Obrigada pelo Feedback!