O mundo mudou e muita gente não percebeu ainda. Hoje não tem mais segredo, não tem mais mistério. Nada é inviolável, tudo pode ser copiado. Esse é o tema da minha coluna dessa semana no AcontecendoAqui. Será mesmo que isso é tão ruim assim?
QUEBRA DE SIGILO
04-09-07 Era mesmo só uma questão de tempo: já descobriram um jeito de fazer o iPhone funcionar com qualquer operadora.
Se você passou os últimos meses no Uzbequistão, eu explico. É que a maior sensação tecnológica desse ano, lançada pela Apple nos Estados Unidos, é um telefone com uma série de características inovadoras. O afã de conseguir tal ícone de status tecnológico reuniu tantos compradores que se pode dizer que o conceito de fila quilométrica adquiriu um novo sentido depois do iPhone.
Tudo muito lindo se não fosse por um detalhe: pela legislação de telefonia que vigora nos Estados Unidos, era necessário que o aparelho fosse vinculado a uma operadora, o que obrigou a Apple a desenvolver sofisticados mecanismos para garantir o bloqueio. Vã ilusão nesse mundo de garotos curiosos. Bastaram apenas dois meses para que o sistema fosse destravado usando pelo menos 3 métodos diferentes divulgados na Internet.
O evento me lembrou da minha aula de Gestalt e Percepção da Forma para alunos do curso de design. Levei a turma toda para um shopping center com a tarefa de reconhecer as leis da Gestalt em um lugar que eles estavam acostumados a freqüentar. Deviam desenhar cenários para cada uma das oito leis, e, para isso foram munidos de material de desenho (está prevista uma aula com câmeras fotográficas, mas primeiro eu queria máxima atenção nos detalhes).
Que os seguranças implicassem com um bando de jovens munidos de pastas do curso de design, papel e lápis de desenho, era surrealista, mas esperado. Sei agora que deveria ter pedido autorização formal, mas confesso que nem passou pela minha cabeça que a prática pudesse parecer suspeita a alguém.
Fiquei num lugar fixo para tirar as dúvidas e vários alunos relataram que, ao se postarem diante de uma loja ou corredor para desenharem as fachadas, seus gerentes e responsáveis vieram reclamar de roubo de sua imagem. Mesmo explicando os objetivos, pedindo autorização e mostrando o roteiro das aulas, as reações não mudaram. Uma lojista acusou um aluno de estar copiando o seu logo, para ela, seu patrimônio mais importante. Encho-me de pena de uma pessoa que defende assim “o seu maior patrimônio”. Raciocinem comigo: se eu quisesse copiar alguma coisa, seria mais fácil fotografá-la ou ir na página da loja na Internet e salvar a imagem…dããã….
Surpreende-me como enormes e minúsculas empresas ainda não se deram conta de uma coisa básica: o mundo mudou! Não há mais segredos, sigilos ou mistérios. Não existe mais nada que não possa ser burlado, copiado ou imitado. Longe de mim defender a pirataria, mas essa é uma guerra perdida. Se a indústria fonográfica brasileira já tivesse se dado conta disso, estaria faturando alto vendendo nossa música para o mundo todo no iTunes. Em vez de aceitar os fatos e tirar proveito, prefere teimar e continuar disputando com camelôs a venda de CDs. Quem se daria ao trabalho de comprar um CD pirata se pudesse baixar sua música favorita na Internet por apenas R$ 1 real?
Quantas bolsas vocês acham que a Louis Vuiton deixa de vender por causa da pirataria? Será que as senhoras que freqüentam a Daslu não notam a diferença entre uma bolsa totalmente confeccionada a mão por anões albinos, com couro de cabras suíças pós-graduadas e forro de seda pura tecida por virgens indianas, e aquelas coisinhas toscas oferecidas no camelô por R$ 15,00?
E estamos falando até agora apenas em cópias, ou, como os spams que me chegam preferem chamar, réplicas perfeitas. Mas não são só produtos, marcas ou músicas que se pode plagiar. Nem o conceito está a salvo. Você notou quantos clones do iPod há no mercado vendidos por marcas famosas e de reputação ilibada? Como os computadores ficaram brancos de repente, logo depois que a Apple lançou seus alvos modelitos? Reparou na legião de marcas de cosméticos ecológicas e amazônicas inspiradas na Natura? Claro que há uma saída elegante para tudo isso: as empresas sérias chamam esse movimento pouco imaginativo de tendência.
Gente, nesse mundo global tem espaço para originais e cópias, sim! Quem compra CD no camelô não está deixando de comprar na loja. Simplesmente não compraria em lugar nenhum. De novo, não estou incentivando a pirataria (que é crime!), apenas alertando que não adianta fazer cara de injustiçado e sair enxotando alunos que desenham em frente à sua loja ou bloqueando celulares!
Pessoas inteligentes têm que pensar em saídas criativas para viver nesse novo mundo, nessa novíssima economia. Armar-se até os dentes para lutar guerras perdidas faz com que o empreendedor desperdice energia preciosa que poderia estar sendo usada para bolar novas formas de oferecer seus produtos a novos mercados ávidos por consumir. Vamos abrir a cabeça! Vamos nos espelhar em Giorgio Armani e tratar a cópia como um elogio!
Gente com mania de perseguição não vive em paz, e o que é pior, não produz. Eu, se fosse dona de uma das lojas em questão, teria aproveitado a presença de designers para pedir uma consultoria grátis sobre a sua marca gráfica. Certamente ela teria muito a ganhar aprendendo o que é pregnância.
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