Não faz muitos anos, a pessoa só precisava descrever suas competências profissionais no currículo (mesmo assim, só quando carecia de achar um emprego). Hoje, além da fila andar muito mais rápido, tem uma galera trabalhando de maneira autônoma ou como pessoa jurídica.
Vai daí que quase todo mundo que está no mercado precisa se apresentar profissionalmente de maneira resumida, seja em sites, blogs, redes sociais, palestras, artigos, entrevistas ou até, veja só, o bom e velho currículo.
O que tenho visto é que tem um povo por aí misturando as coisas e sendo alvo de vergonha alheia por pura desinformação (e, muitas vezes, por falta de noção também).
Geralmente você tem que vender seu peixe em poucas linhas e a tentação de usar clichês e se auto-elogiar é grande, mas resista, por favor.
Claro que, dependendo do perfil e do serviço oferecido, a pessoa sempre pode ousar mais e fazer poesia, trocadilhos, usar frases de efeito e tentar ser engraçada, mas aí o risco cresce bastante. Se você prefere pagar para ver, fique à vontade. Mas seguem algumas dicas para pensar a respeito.
Para seu próprio bem, pense mil vezes e depois mais mil antes de usar os seguintes termos para se apresentar (serve para empresas, estúdios e agências também):
Criativo. Adoro (só que não) quando isso vem no perfil de um designer, arquiteto, publicitário ou ilustrador (ou empresas da área). Sim, porque se essa gente não for criativa, morre de fome; é pré-requisito básico para trabalhos como esses. É mais ou menos como um dentista dizer que tem coordenação motora fina ou um jornalista dizer que seu português é bom (se que que há muitos com português péssimo, mas vá lá). Não acrescenta nenhuma informação relevante e depõe contra o bom senso do profissional (o pior é quando isso aparece como diferencial).
Inovador. Esse é meu preferido; quase todo mundo que se acha muito criativo coloca junto o onipresente “inovador“. Só para esclarecer: inovador é aquele sujeito que transforma uma ideia original em negócio (de preferência, lucrativo). O inovador, quando é bom mesmo, chega a mudar a base de competição do mercado. E aí, vai bancar? Acho melhor não, viu? É sempre preferível que o mercado conclua sozinho se você merece o atributo (ou não, como diria Caetano).
Proativo. Quem é proativo não diz, mostra: quais negócios iniciou, quais projetos realizou, quais mudanças fez nas empresas onde trabalhou ou na escola onde estudou, que diferença fez onde se meteu. De resto, quem tem permissão para usar esse adjetivo para se referir à qualidade do seu trabalho são os outros, jamais (entendeu bem? jamais!) a própria pessoa.
Motivado. Aiaiai… motivação é uma coisa tão básica, mas tão básica para alguém que está se apresentando profissionalmente que, já que você colocou isso como atributo diferencial, aproveite e diga também que é limpinho e cheiroso (toma banho todo dia).
É bom no relacionamento com colegas. Esse item também costuma ser chamado de “sabe trabalhar em equipe“. Você conhece alguém que diga que tem dificuldades de relacionamento no trabalho ou que não sabe trabalhar em equipe? Eu não. Novamente, essa característica só os seus colegas (ou chefes, ou subordinados) podem atestar. Sua palavra, nesse caso, não vale.
Aprende rápido. Outra obviedade que não acrescenta nada; todos os profissionais que estão no mercado, de um jeito de outro, aprendem rápido. Se não, estariam fora.
Ético. Observe o naipe das pessoas que têm usado esse adjetivo para se descrever (lembrando que esse ano é de eleições). Significa alguma coisa? Sim, significa que é pelas atitudes que sabemos quem é ou não ético; não pelo discurso. Tire essa palavra da sua apresentação, ela não vai ajudar (é tipo o hotel escrever numa placa que é familiar; se precisa escrever é porque obviamente não é).
Comprometido com os objetivos. Raciocinem comigo: faz sentido alguém oferecer algum tipo de serviço se não quer se comprometer com o resultado? Alguém, em sã consciência, se auto-descreveria como “tô nem aí, só quero levar o meu“? Qualquer profissional, por mais incompetente e personalista que seja, vai jurar pela avó falecida que é comprometido com os objetivos. O que significa que essa expressão não significa rigorosamente nada numa apresentação.
Pôxa, mas que chata e estraga prazeres! Assim não sobrou nada para escrever!!
Sobrou sim, e justamente a parte que interessa: sua formação resumida (o que aprendeu) e os serviços que você oferece (o que você fez com o que aprendeu). Tudo em poucas linhas, sem muitas firulas e, principalmente, nenhum (mas nenhum mesmo) adjetivo. Economiza o tempo de todo mundo, livra você de constrangimentos desnecessários e demonstra objetividade.
Já faz algum tempo, tenho visto algumas variações interessantes: o sujeito coloca a formação, o que faz e mais uma frase final com alguma curiosidade engraçadinha, para quebrar o gelo, tipo: Pedro da Silva, físico nuclear com doutorado em fusão a frio, pesquisador do laboratório tal e tocador de pandeiro. Membro fundador da Associação de Trekking de Pindaíba do Sul. Pedro não precisa dizer que é uma pessoa com interesses diversos, integrado na sociedade e praticante de esportes; ele mostra.
Outro exemplo: Sabrina Matos, administradora de empresas, consultora em finanças com mestrado na PUC e MBA em Cambridge. Cinéfila e praticante de asa delta nas horas vagas. Repare que a Sabrina mostrou que é ousada, dinâmica e apreciadora de arte sem usar essas palavras e se auto-elogiar. Muito mais elegante. Mas atenção, não é um texto inteiro sobre seus gostos e preferências recheado de piadas e gracinhas; é só uma frase com uma dica reveladora e bem-humorada.
Gosto bastante do modelo, mas ainda não me arrisquei não. Convém pensar bastante antes de partir para a ação. É mais difícil do que parece.
Bora dar uma revisada no seu perfil?
Leo Strong
Muito bom.
“já que você colocou isso como atributo diferencial, aproveite e diga também que é limpinho e cheiroso” kkkkkkkkkkkkkkkk
Alexander Carnier
Fez muito sentido. Bora! 🙂
Pri-k
Amei!
Desde o dia em que você compartilhou a indicação do Ênio (acho que era esse o nome) eu deixei o post aberto e só agora consegui ler. Mas já compartilhei com meus alunos!
Bjx
ligiafascioni
Obrigada, lindona <3
Karla
Faltou o “líder nato”. Muito clássico! hahaha
ligiafascioni
Aahahahah… verdade, Karla 🙂
Louise
Acho que esses “criativos, proativos e com bom relacionamento interpessoal” são ideais para as vagas (que parecem estar se multiplicando) de emprego em que CLT é citada como benefício e de estágio para quem não é estudante.