Você tem que me ajudar

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Vivo recebendo (e imagino que você também) mensagens que começam com “você tem que me ajudar”. As variações são pouco criativas: “estou fazendo uma pesquisa/trabalho e preciso que você…”, “estou precisando de um emprego e…”, “quebraí o meu galho, vai…”, “preciso urgente vender meu carro e…”. Em resumo, o umbigo da pessoa ocupa todo o espaço disponível no texto e, não raro, chega a transbordar horas depois quando chega outra mensagem cobrando uma resposta.

Às vezes dá vontade de ler o conteúdo só por curiosidade, mas depois de receber tanto pedido sem cabimento, dificilmente o sentimento despertado é de solidariedade ou comiseração (mesmo assim, que fique registrado, sempre leio tudo e tento ajudar na medida do possível).

Ah, se as pessoas tivessem noção de que liderança não tem a ver com chefia, cargos ou vida profissional, quão mais eficientes seriam as comunicações entre as pessoas…

Toda vez que a gente quer que alguém nos ajude com alguma coisa, é preciso pensar primeiro em como encorajar essa pessoa a fazê-lo. Ninguém tem obrigação de arrumar emprego para um colega ou ajudar a vender seu carro, colaborar numa campanha ou responder a uma pesquisa. A vida não está fácil para ninguém e cada um tem seus próprios problemas e prioridades para resolver, que não são poucos. Não me entendam mal: solidariedade é necessária no mundo. O que estou propondo aqui é um meio de aumentar a colaboração sem apelar para o coitadismo ou a falta de educação.

Aí é que entra a questão da liderança: chamamos líder alguém que enxerga um cenário futuro como resultado de seu trabalho (também conhecido por visão) e consegue despertar nas pessoas a vontade de segui-lo no caminho que vislumbra para chegar lá.

Quanto mais ousada e abrangente é a visão, mais o líder sabe que precisa de ajuda. Aí é que entram as atitudes que ele/ela precisa desenvolver, e a primeira delas é conseguir descrever claramente esse cenário de maneira a animar as pessoas que quer engajar.

Mas ninguém vai se sentir motivado a ir junto se o cenário só beneficiar o líder e mais ninguém (já falamos sobre isso em “visão não é selfie”). Então, se o líder quer que as pessoas ajudem, jamais deve começar a descrição do cenário como “Preciso cumprir a meta do mês e…”.

Sabe-se que não é possível motivar outra pessoa, pois a motivação é um sentimento interno. O que se pode fazer é construir as condições favoráveis para que a pessoa se sinta capaz, confiante, entusiasmada e estimulada a colaborar na construção de uma visão que a emocione de alguma maneira.

Beleza, mas como vou convencer alguém ajudar a me arrumar um emprego? Ou a responder minha pesquisa para o TCC? Ou a vender meu carro? Ou a ajudar as crianças do orfanato?

Vejamos.

Se em vez de ligar para todo o pessoal que participa da pelada de domingo pedindo desesperadamente um emprego, o Asdrúbal primeiro estudasse a empresa na qual gostaria de trabalhar e o cargo (ou seja, começasse a construir a visão), conseguiria apresentar a ideia de maneira que fosse atraente para a própria empresa e para o Mário que trabalha lá; acompanhe.

Asdrúbal poderia chamar o Mário para uma conversa e dizer: “olha, estou me desligando da firma em que trabalhei nos últimos três anos e vi que há uma oportunidade na empresa YY; penso que poderia contribuir muito nessa função, uma vez que aprendi bastante sobre atendimento ao cliente nos dois cursos de extensão que fiz e enquanto era gerente do departamento tal. Desenvolvi um sistema que pode ser útil para a empresa YY, principalmente no segmento X. Seria possível obter um contato para apresentar uma proposta de trabalho?”. O Mário vai vislumbrar o seguinte cenário: uma melhoria significativa no atendimento ao cliente da YY (o que é bom para todo mundo) e o melhor: foi ele quem descobriu o talento e o indicou. Como não ajudar?

A chave é descobrir qual é sua visão e encontrar pessoas que compartilhem dela; pessoas que consigam ver valor na proposição e estejam dispostas a se mexer para fazê-la acontecer.

Vejamos o exemplo da venda do seu carro; o que eu mais gosto é desse vídeo que um diretor de arte americano fez para vender seu velho e fiel companheiro de 18 anos, todo rasgado e detonado. Vê se não dá vontade de divulgar a venda dessa joia, mesmo sem ele ter pedido.

Claro, você pode não ter o talento todo desse sujeito, mas pode muito bem pensar num jeito de apresentar a ideia que não seja apenas vantajosa para você, mas também para as pessoas de quem você espera colaboração.

No caso da pesquisa para seu TCC, sempre imagino que o estudo trará mais informações e conhecimento a respeito de um determinado assunto (que, naturalmente, é de interesse do entrevistado). Aí é mais fácil; basta oferecer o arquivo com os resultados do trabalho e enfatizar que o levantamento está colaborando para que se compreenda melhor a questão X. Ainda se pode acrescentar que o desdobramento da pesquisa prevê a busca de uma solução para o problema Y.

Campanhas para ajudar qualquer causa sempre rendem mais colaboradores quando oferecem um cenário inspirador (uma festa, um prêmio, produtos para venda, fotografias bacanas, humor, etc) do que o eterno mimimi repetindo a ladainha que o mercado é cruel e injusto. Apelar para o sentimento de culpa das pessoas funciona às vezes, mas emocionar positivamente é muito mais sustentável e gratificante.

Feito isso, não pedirei para você compartilhar esse texto (detesto quando pedem isso…rs), vou fazer melhor: convidá-lo para juntos tentarmos ajudar a diminuir o tráfego de mensagens apelativas e mal educadas e a aumentar os pedidos colaborativos e inspiradores.

Já pensou se todo mundo pudesse ler esse texto, como ajudaria?

2 Responses

  1. 15 maio 2014 at 9:51 am

    Pronto: tá compartilhado! Porque você não pede. Sugere e convence. Recomenda com inteligência. (além disso, o texto é ótimo!)

  2. 15 maio 2014 at 2:45 pm

    No meu dia a dia, entro em contato com dezenas de assessores de comunicação. Muitos deles deviam ler o seu artigo antes de me enviar e-mails em que praticamente imploram pra que seus releases sejam publicados.

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