Um livro com spoiler no título?
Eu já tinha visto “They both die at the end” (Tradução livre: “Os dois morrem no final”), de Adam Silveira em várias livrarias, perfis de redes sociais, vitrines, enfim, e não é de hoje, pois a obra é de 2017. Não me senti imediatamente atraída porque está classificada como um romance adolescente (já passei dessa fase faz muuuito tempo) até que, há algumas semanas, encontrei o bonito num sebo. Eis que pensei: por que não, né?
Olha, não me arrependi. Que história mais linda e que sensibilidade para contá-la.
O livro poderia ser classificado também como ficção especulativa, pois parte de um evento bem bizarro para basear a trama; olha só.
Há uns 4 anos (anteriores ao início da história, que se passa no mundo contemporâneo), sabe-se lá por quê, começou-se a ter a informação de quando uma pessoa iria morrer. Ninguém sabe onde está essa base de dados, mas o fato é que tem uma empresa, chamada Death-Cast (poderia ser interpretado como Elenco da Morte, ou algo assim — vou preferir usar no original porque não consigo encaixar isso naturalmente no texto), que liga para a pessoa avisando-a que ela vai morrer naquele dia. Não é possível dizer exatamente o horário e nem a causa. Pode ser que a pessoa morra faltando um minuto para virar a meia-noite ou morra nos minutos seguintes.
Se for uma criança ou uma pessoa inconsciente ou sem condições de entender, os responsáveis são avisados.
O negócio é bem bizarro e não faz o menor sentido. Mas ficção é para isso mesmo: exercitar a imaginação.
Eis que temos Mateo, um rapaz de 17 anos (vai completar 18 daqui a duas semanas) cuja mãe morreu no parto. Desde então, ele vive com o pai, com quem parece ter uma ótima relação. Mateo é extremamente tímido e introspectivo; ele só tem uma amiga, bem mais velha, que ele considera uma irmã. A moça estava grávida do namorado quando ele recebeu o fatídico telefonema, deixando Lídia viúva. Mateo adora a pequena Penny e elas são sua pequena família, pois há alguns meses o pai dele está em estado de coma, internado num hospital. Pois Mateo está sozinho em casa pouco depois da 1 da madrugada quando o telefone toca lhe dando a notícia que esse é o último dia dele vivo.
Rufus tem também 18 anos e mora num abrigo. A família toda dele: pai, mãe e sua adorada irmã mais velha, recebeu o telefonema num belo dia. Todos ficaram apavorados e foram passar o último dia juntos na casa de campo. Sofreram um acidente, o carro caiu no rio e apenas Rufus sobreviveu, sentindo-se abandonado pela família.
Bom, Rufus ama os amigos do abrigo, mas está triste porque uma das meninas, que era sua namorada, não apenas foi adotada por uma família como começou a namorar outro rapaz. Revoltado, ele junta o grupo que compartilha seu quarto (eles se chamam de “Os Plutos” em homenagem a Plutão, que foi desclassificado como planeta no sistema solar) para dar uma surra no novo namorado de Aimee, quando o telefone dele toca com a tão temida notícia. Ele agora é um “Decker” (não consegui traduzir isso de maneira que fizesse algum sentido, então vou usar no original mesmo), ou seja, as pessoas que receberam o telefone fatídico e estão vivendo suas últimas horas.
O livro vai intercalando personagens diversos que de alguma forma estão interligados com a história dos dois; alguns receberam o telefone, outros não.
Aparentemente, o “último dia” se torna um grande negócio e há uma grande infraestrutura para os deckers; parques temáticos, arenas com realidade aumentada para a pessoa “viajar pelo mundo”, já que não vai conseguir de verdade, experiências radicais, e até cortesias em alguns restaurantes. As pessoas, em geral, são empáticas e solidárias quando encontram um decker, principalmente sendo jovem.
A vantagem é que a pessoa pode escolher como quer passar seu último dia: se com amigos, sozinha, fazendo o que mais gosta, enfim. Também dá para realizar o próprio funeral (com corpo vivo e presente) onde todos podem fazer seus discursos e resolver alguma pendência.
Pois era madrugada e os amigos estavam reunidos no abrigo com Rufus para as despedidas quando chega a polícia (o rapaz que apanhou foi direto para a delegacia dar queixa, mesmo sabendo que Rufus era um decker), de maneira que a cerimônia foi interrompida, Rufus conseguiu fugir de bicicleta e dois de seus amigos foram presos.
Agora é madrugada em New York, Rufus não sabe quanto tempo de vida ainda tem e nem como irá morrer. Mateo está em casa jogando videogame totalmente catatônico.
Aí entra em cena um aplicativo chamado Last Friend (algo como “Último amigo”) que foi criado justamente para pessoas que se sentem sozinhas no dia final. Mateo tenta se conectar com alguém; não dá muito certo. Ele tem medo, pois as pessoas são estranhas e têm taras mais esquisitas ainda. Rufus para para descansar da fuga e também entra no aplicativo. Ambos têm as mesma idade e acabam dando “match”.
É aí que começa a parte bacana da história. Os meninos se estranham no início (Mateo é bem desconfiado e Rufus não quer dizer que está sendo perseguido pela polícia). Eles conversam, visitam o pai de Mateo no hospital, passam por experiências, fazem confissões, andam de metrô, exploram lugares, dançam, reencontram amigos, dançam, cantam, passam por experiências maravilhosas e outras decepcionantes, vivem intensamente como nunca antes na vida e… morrem.
Não vou dizer quando, nem como. Só vou dizer que vale muito a pena acompanhar esses dois no seu último dia.
E esse livro me fez pensar muito. Se eu soubesse que hoje era meu último dia, o que eu faria? Cheguei à conclusão que faria uma festa e juntaria o máximo de pessoas queridas só para agradecer por elas terem passado pela minha vida. Mesmo que não desse tempo de fazer um encontro pessoal, faria chamadas de vídeo, sempre grudada no meu amor e nas minhas gatinhas. Ia ficar muito triste de partir tão cedo (ainda tenho muitos planos), mas iria sentindo muita gratidão no coração por ter sido tão sortuda.
E você? Como passaria seu último dia?
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