Porque a sexta é melhor que o sábado
A maioria das pessoas que conheço (e me incluo também) se auto-descreve como otimista. Pois é, pelo que acabei de ler, parece que o povo está falando sério mesmo.
Se tivesse que resumir o livro “The optimism bias: why we’re wired to look on the bright side” do neurocientista Tali Sharot em um frase, diria que ele explica porque as pessoas tendem a ver sempre o lado positivo das coisas. Não tem mistério: somos programados assim por uma questão de sobrevivência, olha só.
Tali começa mostrando como a nossa percepção vive nos pregando peças. As ilusões visuais são velhas conhecidas (ele mostra algumas clássicas no livro), mas podemos nos autoenganar com todos os outros sentidos. Além disso, geralmente a gente acha que é mais competente, inteligente, interessante, lógico e bonito do que realmente é, entre outras coisas.
Não adianta você dizer que não e sair desfilando sua modéstia; isso é estatisticamente verificado; o autor apresenta pesquisas feitas no mundo todo. O entrevistador pede para a pessoa se auto-avaliar e dizer se está abaixo, na média, ou acima da média em vários quesitos (ex: honestidade, beleza, liderança, bom senso, inteligência, relacionamentos, etc) .
Só para se ter uma ideia, 93% das pessoas consideram que dirigem melhor que a média. Ótimo, então como é que apenas 7% podem estar na média ou abaixo dela? A conta não fecha. Conclusão: tem muita gente (a maioria) se achando melhor do que é de fato.
O engraçado é que a gente consegue ver claramente esse desvio nos outros, mas dificilmente em nós mesmos. Nossa percepção da realidade é subjetiva e não raro é diferente da realidade objetiva.
A explicação é que de fora fica mais fácil de ver a diferença entre a realidade e o que o outro está percebendo. Como a gente não consegue ver a nossa, automaticamente conclui que somos menos sucetíveis a esse tipo de distorção de julgamento, por isso se acha melhor que os demais. Sei que dói ouvir, mas isso é verdade para mim, para você e para toda a torcida do Flamengo.
Uma outra coisa importantíssima é a nossa habilidade de viajar mentalmente no tempo e no espaço; podemos voltar ao passado ou projetar o futuro num piscar de olhos, sem nenhuma preparação especial; é só querer. Nosso cérebro foi desenvolvido com essa capacidade e quanto mais a gente usa, mais consegue fazer isso bem.
Pois é, agora é que vem o fato curioso: em última instância, é justamente essa capacidade de viajar mentalmente que nos faz ser tão otimistas. O desvio para ver as coisas de maneira positiva (inclusive em nós mesmos) simplesmente não existe sem a capacidade elementar de considerar o futuro.
A nossa percepção da realidade, aliás, é afetada por muitos fatores. Um dos mais importantes é imaginar o que os outros esperam de nós. O livro apresenta mais uma batelada de pesquisas onde o desempenho das pessoas varia absurdamente por causa de uma palavra citada antes de um teste (a simples menção da palavra “estúpido” no cabeçalho de uma prova pode alterar completamente a média geral para baixo, para se ter uma ideia).
Ele fala também o fenômeno da profecia auto-realizável: você ou outra pessoa projeta expectativas que acabam acontencendo porque você se esforça para fazê-las acontecerem. Por exemplo: diga aleatoriamente para 5 alunos em uma sala de aula que eles são mais inteligentes que os outros e veja quem tirará as melhores notas. Batata, não tem erro.
Tali fala também que, por causa dessa nossa capacidade de projetar o futuro, adoramos esperar um pouco para receber a recompensa. Se a comida for deliciosa, aguardar por ela faz parte do prazer da refeição; se o carro é customizado, você não se incomoda de ficar um mês inteiro sonhando até o dia de seu tesouro chegar. É aquele ditado que diz que preparar a festa é tão ou mais gostoso que a festa em si; é a ciência abalizando o que sua avó sempre disse. Quanto maior a expectativa do prazer, mais as pessoas curtem a espera e até se decepcionam um pouco quando a coisa acontece rápido demais.
O livro, que recomendo bastante, fala ainda sobre a relação entre o otimismo e a depressão; sobre como o cérebro aumenta de tamanho as áreas que são mais trabalhadas da mesma maneira que os músculos crescem quando exercitados; enfim, tem muita coisa boa para se aprender.
Como conclusão, as pesquisas só mostram o que todo mundo já sabia faz tempo: porque a sexta-feira (e não o sábado) é o dia mais adorado da semana (e não o domingo, quando ninguém trabalha).
Pois é, então só posso desejar pra todo mundo o óbvio depois de ler isso tudo: uma longa e deliciosa espera até um final de semana cheio de surpresas ótimas!
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