Tudo é rio

Gosto de contar como os livros vieram parar nas minhas mãos porque, para mim, livro é um objeto sagrado. Um portal para outras dimensões que me fazem viajar no tempo e no espaço. 

Depois que comecei a seguir o Clube do Livro de Muenster no Instagram (a Valéria Jansen tem um grupo no WhatsApp) comecei a me inteirar mais do que está rolando na literatura brasileira. Pois no clube só se fala na Carla Madeira, e “Tudo é rio” foi eleito um dos melhores do ano pelas leitoras. Curiosa, comprei, claro. O outro romance dela, “A natureza da mordida”, está na pilha da minha cabeceira.

Mas aí me lembrei que em meados de 2017, uma amiga minha, a Lia Krücken, tinha um apartamento que alugava pelo AirBnb aqui em Berlim. Um dia ela estava viajando e me pediu para receber uma hóspede que estava chegando. Juntando os pontinhos, descobri que era ninguém menos que a Carla Madeira em pessoa. Obviamente ela não se lembra de mim, mas eu a guardei na lembrança porque no rápido small talk que tivemos, ela me contou que era de Belo Horizonte (minha cidade do coração) e sócia da agência Lápis Raro, onde minha amiga Cris Guerra já trabalhou. Bom, o mundo dá voltas e eu aqui agora babando pela obra da moça. “Tudo é rio” foi lançado em 2014 e eu, na minha ignorância do que rolava na cena editorial brasileira, perdi de ganhar um autógrafo. Fica pra próxima, né?

Mas vamos à história: começa contando a trajetória de Lucy, uma filha única muito amada (e mimada) que perdeu os pais ainda criança, indo viver com uma tia e as primas. Acostumada a ser o centro das atenções, teve dificuldades em se adaptar. A tia também não conseguiu amar aquela criança difícil como gostaria, e a predileção pelas primas nunca foi disfarçada. 

Na adolescência, Lucy descobriu que tinha um imenso poder sobre os homens; autocentrada no último grau, divertia-se com a ideia de poder ser o centro de tudo novamente e acabou se tornando prostituta. Um pouco da história dela me lembra Hilda Furacão e Dona Beja, não por acaso, também mineiras.

Logo em seguida, a gente fica conhecendo Dalva e sua tão numerosa quanto amorosa família e seu namoro com Venâncio. A mãe de Dalva, Aurora, é a personagem mais sábia e admirável da história, que não economiza em mulheres marcantes, generosas e inteligentes.

Dalva e Venâncio, cada um com seu passado, vivem um amor pleno e lindo. Mas Venâncio tem um ciúmes doentio da moça, o que estraga completamente a relação deles. 

Eis que Lucy entra na história, não da maneira esperada, mas ela, com seu jeito vulgar, sua arrogância e egoísmo, acaba ajudando os dois sem querer. 

Olha, fazia tempo que eu não lia um romance que justificasse o nome; uma história de amor daquelas antigas, sabe? E muito, mas muito bem contada. 

Também virei fã da Carla. Recomendo muito, mas muito mesmo.

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