Fazia tempo que eu já estava curiosa para ler Kazuo Ishiguro; depois que ele ganhou o Nobel de Literatura, em 2017, a vontade só aumentou. Achei um livro dele num mercado de pulgas, em alemão, e fiquei com medo de me arriscar, afinal, esses caras que ganham o Nobel não costumam ser fáceis.
Daí que achei “The Buried Giant” num sebo e me senti mais confortável, pois inglês é sempre mais acessível. Olha, fácil não posso dizer que foi. Mas valeu cada sílaba.
A história se passa pouco depois da morte do lendário Rei Arthur, em que povos guerreiros da Grã Bretanha, Saxões e Bretões experimentavam uma era de paz.
Os protagonistas são um casal de idosos, Axl e Beatrice. Interessante como, morando em uma caverna e vivendo em uma comunidade agrícola, eles conversam de maneira culta e civilizada, inclusive com os cavaleiros do rei, quando os encontram.
O desconforto que aparece no início da história é que o casal não se lembra de como se conheceu e nada relacionado aos anos que passaram juntos. Na verdade, essa é uma condição que assola todo o país; as pessoas não têm lembranças nem de seu passado remoto e possuem muitas falhas na memória recente. Com o desenrolar da história, a gente passa a entender porque e como isso aconteceu.
Eis que, em conversa com uma mulher misteriosa que visita a aldeia, Beatrice acaba se lembrando que eles têm um filho. O casal decide então visitá-lo em outro vilarejo (que ela não sabe exatamente onde é) e sai em peregrinação, caminhando em busca do filho perdido.
No caminho, encontram cavaleiros, monges, feiticeiros, dragões, ogros, barqueiros, ilhas misteriosas e tudo o que povoa histórias passadas nessa época. Mas o interessante aqui é que não há heróis ou mocinhos; há pessoas fortes, mas cheias de dúvidas e ideais. Os cavaleiros são incrivelmente honrados e cientes do dever; nem por isso, menos humanos.
Mas o que prende mesmo é a relação do casal; amorosa, cúmplice, acolhedora, mas cheia de dúvidas, afinal, eles não se lembram de nada do seu passado. Que peso isso pode ter na relação?
A história é também cheia de símbolos: o amor, a morte, a fé, a lealdade, o senso de dever, a solidão.
Olha, como eu disse, não foi muito fácil de ler, tanto pela descrição detalhada do cenário, como pelos diálogos sempre formais e as lacunas de tempo que fazem parte da história. Mas esse moço, nascido no Japão e morando na Inglaterra desde os cinco anos de idade, não ganhou o prêmio à toa. Curiosíssima para experimentar mais dos seus universos.
Vai lá que eu garanto!
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