Um livreiro muito triste

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Quando peguei o volume na mão, no mercado de pulgas em frente à Hathaus Schöneberg, fiquei curiosa por dois motivos: o livro falava de livros (assunto sempre interessante para mim) e o autor tinha um nome que parecia brasileiro.

Pois “Das geheime Leben der Bücher” (a vida secreta dos livros), de Régis de Sá Moreira, é o primeiro trabalho traduzido para o alemão desse escritor filho de pai brasileiro e mãe francesa (ele escreve em francês). Achei a tradução do título em alemão ruim, não só porque o original em francês é Le Libraire, mas também porque a história é sobre o livreiro, não sobre os livros.

A novela, em formato de fábula, acompanha a vida de um livreiro solitário. Ele resolve montar uma livraria apenas com os livros que já leu. Para isso, o homem se dedica a ler praticamente todas as horas que passa acordado. Alimenta-se basicamente de chá e de leitura.

A livraria é grande e completa, e está sempre aberta, pois o livreiro dorme sentado em sua escrivaninha. Há clientes reais e imaginários, pessoas corriqueiras e esquisitíssimas; mas nada supera a enormidade que é a solidão do livreiro que se esconde da vida nas páginas de seus amigos queridos. Seus amores platônicos, seu medo de sair da livraria, mesmo que seja para atravessar a rua, seus diálogos, às vezes surreais, com clientes diversos; tudo é narrado com muita delicadeza e sensibilidade.

O livro não segue o contexto tradicional de uma trama, pois, de fato, não há propriamente um clímax, conflitos ou reviravoltas.

Mas as descrições e metáforas usadas para descrever a solidão de ser humano são tão fortes que chegam a ser poéticas.

O livreiro, por exemplo, sofre muito na terceira hora depois do meio-dia. É quando ele se sente miserável e atormentado. Todo santo dia, no mesmo horário.

Além disso, todos os dias, em horários variados, a tristeza vem tomar posse dele, como se fosse sua dona. Uma dor incomensurável, enorme, forte, dominadora, infinita. Ele precisa se esconder no fundo da loja para chorar até se exaurir. Depois de esgotado, a dor vai indo embora, devagar. Até que ele consegue voltar ao normal.

Todo dia.

Um história de depressão contada de um jeito muito triste, mas também muito lindo e pleno de sensibilidade. Gostei de passar uns poucos dias com o livreiro, mesmo que para compartilhar um pouco de sua angústia e suas dores.

Recomendo.

 

3 Responses

  1. Celia
    Responder
    12 novembro 2015 at 8:40 am

    Olá Ligia, acompanho seu Blog e o aprecio muito, seus temas, fotos, suas abordagens e o que percebo nas entrelinhas do que você publica. Recentemente, encomendei um livro sugerido por você, não pela literatura em si, mas a fim de auxiliar no aprendizado do alemão. Estou lendo lentamente e com meu dicionário do meu ladinho, ao qual recorro repetidas vezes. Minha pergunta é a seguinte: após ler seu “testemunho” sobre seu processo de aprendizado da língua alemã, me vi em dúvida a respeito do nível (A1, A2, B1…C2) que você cursava quando da leitura deste livro, Inferno de Dan Brown. Você poderia me esclarecer um pouco mais, por gentileza, sobre seus estudos na VHS em Berlim. A postagem que li a este respeito, finaliza com você descrevendo seu contentamento quanto a esta escola e que cursaria nela a partir do nível B2. Você postou algo mas a este respeito? Se sim, poderia me dizer onde posso ler?
    Um abraço, você me inspira a querer ir sempre adiante, muito obrigada.
    Celia

    • ligiafascioni
      Responder
      12 novembro 2015 at 8:50 am

      Oi, Celia!
      Eu fiz até o B2+ na VHS, mas parei porque, como não tenho oportunidade de conversar, não me senti à altura para acompanhar o C1. É que trabalho o dia todo com meu marido em nossa empresa e ele é brasileiro. Um engenheiro alemão vai começar a trabalhar conosco a partir de janeiro, aí tenho esperança de começar a praticar de verdade, pois será indelicado conversar em português dentro da empresa por respeito a ele.

      Assim, na leitura eu consigo acompanhar razoavelmente bem (apesar de não entender 100% e não ter muita paciência de ir ao dicionário sempre), pois consigo entender a história e o contexto. Minha ideia é me acostumar com as construções das frases e ampliar o vocabulário.

      Também consigo entender, diria, uns 60-70% do que as pessoas falam (como você pode ver, ainda falta muito!). Mas minha maior dificuldade é falar mesmo, pois isso exige prática e exercícios diários. Eu ainda penso antes de falar, fico um pouco apavorada quando falam comigo, consigo me fazer entender, mas sei que cometo um montão de erros (quando depois penso no que falei, sempre me pego melhorando muito a frase e usando verbos e construções mais adequadas).

      Outra coisa que faço é acompanhar diversas páginas do ensino de alemão no Facebook. Sempre tem testes disponíveis e curiosidades. Além do excelente “Quero aprender alemão“, onde aprendi muita gramática.

      Mas de fato, penso que ler é o mais fácil em qualquer língua. A outra questão é que só consigo tempo para ler porque não assisto TV e isso seria uma coisa excelente para meu aprendizado.

      Enfim, temos todos limitações e não dá para a gente fazer tudo o que precisa. Mas pelo menos vou lendo. Ano que vem quero me matricular novamente no B2, pois adoro assistir aulas. E fazer a prova do B2.

      Enfim, é o ponto onde estou no momento!!

      Viel Glück 🙂

      • Celia
        12 novembro 2015 at 1:43 pm

        Muito obrigada, Ligia, por responder-me rapidamente e de forma tão detalhada. Admiro muito isso em você, seu cuidado e delicadeza com seus leitores!
        Vou persistir na leitura do livro, nos meus estudos em casa, e em janeiro, retomo meu curso, B1, em Bremen.
        Desejo a você muito boa sorte com o novo colega alemão e que, a presença dele possa sim, impulsionar seu aprendizado, especialmente sua comunicação oral.
        Um abraço, com gratidão.
        Celia

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