Vou confessar uma coisa: adoro ouvir pedaços de conversas quando estou em um café ou restaurante. Como escuto só partes da história, fico imaginando como se desenrola o resto.
Pois ontem me sentei numa mesa ao lado de dois rapazes de terno que discutiam sobre a necessidade de um aumento de salário. O pedaço que eu peguei foi esse aqui:
— Faz dois anos que estou nesse emprego e até agora não ganhei nenhum aumento.
— Você tem que pedir, senão eles não dão.
— Mas como vou pedir? Tem clima para isso não… fico nervoso, cara…
— Olha, a sua faculdade não aumentou? Então fala que está precisando de mais dinheiro… ou então explica que o salário não está dando, sei lá.
— Boa ideia. Mesmo assim, sei não se vai dar certo, meu patrão é meio pão duro…
Pois é, pão-duro ou não, se o sujeito tiver pelo menos dois neurônios e noções básicas de administração, o moço vai ficar mesmo sem aumento. E ele deve, inclusive, rever as amizades, pois os conselhos do amigo são péssimos; duvido que já tenha conseguido alguma coisa com esses argumentos brilhantes.
Uma coisa óbvia que nem todo mundo se dá conta é que, quando se contrata alguém, há um acordo. O contratado deve fazer determinadas tarefas e assumir algumas responsabilidades. Por esse valor que agregará à empresa, será remunerado de acordo com o acertado. E ponto. Se mesmo depois de anos as tarefas ou responsabilidades continuam as mesmas, por que o salário deveria mudar?
Não custa lembrar que estamos falando de aumento, não de reajuste, que é uma coisa completamente diferente: o reajuste existe para repor as perdas da inflação e para o salário continuar a valer a mesma coisa que valia na época da contratação. Quem negocia o reajuste é o sindicato da categoria; se não está negociando direito, é com ele que você tem que reclamar (você paga 2 dias de trabalho por ano para o sindicato, sabia?). Com o chefe você só pode negociar aumento, ou seja, mudança no seu contrato de trabalho.
Um porteiro, por exemplo, que seja sempre porteiro, mesmo que trabalhe 20 anos na mesma função, com certeza não merecerá aumento. Fazer bem o seu trabalho é o combinado; ser competente, atencioso, responsável, é o mínimo que se exige de alguém com esse cargo. O salário contratado para um porteiro é para pagar isso mesmo.
Com o rapaz do café, a história é a mesma. Se ele continua executando as mesmas funções de dois anos atrás, por que quer ganhar aumento? Para mudar o valor do contrato, é necessário que tenha havido alguma alteração no escopo. Mais responsabilidades, mais valor, salário maior. Senão, nada feito.
E a coisa pior que uma pessoa pode argumentar ao pedir a revisão do contrato (é exatamente isso que ele faz quando pede aumento) são suas necessidades pessoais. Já pensou, você vai comprar pão e ele está custando mais caro, sendo que o padeiro justifica que está precisando de dinheiro porque o filho foi fazer intercâmbio? O que você faz? Vai comprar pão em outra padaria, né? As contas do padeiro são problema dele, você não tem nada a ver com o intercâmbio do filho dele. Se ele precisa de mais dinheiro, invente pães mais caprichados, agregue mais valor. Choramingos não seduzem ninguém. Nem você, nem o moço do café, garanto.
A única coisa que justifica o aumento de preço é o aumento de valor do ponto de vista do cliente (sempre). A gente paga mais caro se acha que a coisa vale. Sabemos que essa percepção é bastante subjetiva, por isso é tão importante fazer a gestão da marca.
Profissionais que construíram uma marca bem consolidada podem cobrar mais daqueles clientes que conseguem perceber valor no que ele está entregando. Se o chefe do rapaz não está percebendo aumento de valor no trabalho dele, se ele não conseguir mostrar a diferença que está fazendo na empresa, não adianta mesmo se fazer de coitado.
Em resumo, quem está pagando é que decide se o preço é justo ou não. Se a outra parte discorda e acha que vale mais, convém prospectar outros clientes no mercado. Simples assim.
Mas o que me chamou atenção mesmo foi outro aspecto da conversa. É possível uma pessoa ficar dois anos inteiros fazendo exatamente o mesmo trabalho, sem ter tido nenhuma ideia original para acrescentar ao contrato ou assumido mais responsabilidades?
Pois é, agora só falta mesmo o moço colocar no currículo que é proativo…
Lígia Fascioni | www.ligiafascioni.com.br
Felipe Genuino
Boa colocação Lígia.
Obrigado.
caio martins
mais um excelente post, ligia. boas colocações.
quanto a último pergunta, sobre ‘2 anos fazendo a mesma coisa’. bom, acho que é bem possível sim. ou não é isso que acontece com alguns cargos que se disputa em concursos?
e concurso ainda é pior, porque é dificilimo ‘buscar outra pessoa’.
agora na area de design, normalmente espera-se que a pessoa seja proativa, cheia de ideias originais, inovadora e etc. mas não é só disso que é feita essa profissão.
eu fico muito incomodado quando ouço coisas do tipo:
“você é designer, não é? inventa uma coisa nova aí!”
“ah, você é tão criativo. certeza que vai me surpreender”
acho uma forçação de barra sem limites.
ligiafascioni
Oi, Caio!
Pois é, mas os concursados não se mexem, mas também não ganham aumento. O que eles ganham é reajuste, coisa diferente. E se são promovidos sem mérito, é distorção do sistema – na iniciativa privada o que conta é o valor entregue mesmo.
Sobre designers terem muitas ideias, acho que precisam ter sim. É disso que esses profissionais vivem: ter ideias originais. Se não está rolando como deveria, convém rever os conceitos…. 🙂
Abraços e sucesso!
Ênio Padilha
Belíssimo! Tanto o artigo quanto às respostas aos comentários.
E isso vale também para os nossos colegas, Arquitetos e Engenheiros, que acham que explicando ao cliente quanto CUSTA manter seus escritórios conseguirão cobrar mais pelos seus projetos.
Kellyene
Oi Lígia, bom tema pra discussão !
Bom eu acho que na prática a coisa deveria realmente funcionar assim de forma bem objetiva … mas … na minha opinião não funciona. Em algumas empresas por mais que você seja O cara, você nunca será promovido sem estar com o pé na porta da rua …
Eu acho ainda que em algumas áreas mensurar uma realização como algo diferente do seu trabalho habitual é bem dificil … tão dificil que na hora de pedir um aumento se seu chefe não tiver esse feeling pra lembrar dessas coisas, (ou mesmo o funcionário pra ressaltá-las) a promoção pode não acontecer.
Seguindo o exemplo do porteiro … se ele, além de fazer bem tudo que faz, arranjar uma forma mais eficiente de organizar a correspondência, seu superior pode simplesmente dizer … “Isso está dentro das suas atribuições, você não fez nada de excepcional”.
Outro ponto é … em empresa com muitas hierarquias e muitos papéis executar outras funções ou ter outras responsabilidades as vezes não está nem ao seu alcance, as vezes só recebendo uma promoção mesmo para assumi-las e ai está um empasse rs.
Isso sem contar casos piores … quando o chefe tem um queridinho que não é nem tãooo bom assim … ou parente … enfim.
Eu acho que o chefe pode decidir sobre a promoção, mas é sempre o funcionário que decide sobre sua carreia.
Beijo.
ligiafascioni
Kellyene,
Você resumiu muito bem tudo com a última frase: “O chefe pode decidir sobre a promoção, mas é sempre o funcionário que decide sobre sua carreira”. Se a coisa está tão ruim assim e o profissional acha que vale mais do que está ganhando, que procure outro cliente, oras. A questão é que as pessoas costumam superestimar suas competências… nem todo mundo é tão bom, criativo e sensacional como se acha. Continuo achando que todo mundo deveria ter a experiência de contratar alguém e pagar seu salário – é uma experiência transformadora, posso garantir.
Obrigada e muito sucesso 🙂
Cláudia R.S.Vieira
Este é um tema bom para aprofundar…
Gostei do seu texto, mas a reflexão não pára por aí.
Você afirmou que se o chefe não percebe ganho de valor no trabalho do profissional contratado, não vai querer dar o aumento de salário desejado por este profissional. E se o funcionário não concorda com o comportamento do chefe, deve procurar outro emprego.
Mas, e se o chefe se fizer de cego? E se o profissional fizer diferença nos negócios da empresa mas o chefe não quer reconhecê-lo simplesmente porque é um mão fechada? Talvez você esteja pensando que o funcionário deva procurar outro emprego, não é?
Mas, não é tão simples encontrar oportunidades de trabalho assim, por mais que o grau de empregabilidade da pessoa seja altíssimo. Há variáveis que interferem diretamente, como por exemplo, o lugar onde se mora, as ofertas do mercado local, os compromissos assumidos que não podem ser adiados. Tenho dúvidas se as soluções que você propõe são tão simples assim……
ligiafascioni
Oi, Cláudia!
Concordo com plenamente com você, soluções nunca são tão simples. Ou são. Depende da pessoa, do problema e do contexto. Às vezes a gente mesmo é que constroi as grades em volta para não sair de onde está, mas cada caso é um caso. De qualquer maneira, meu texto não pretende resolver problemas (quem me dera tivesse esse poder), mas apenas provocar reflexão e chamar atenção para um ponto de vista que talvez não tenha sido considerado.
Se bem que, cá entre nós, continuo optando por chutar o pau da barraca, mesmo que a coisa seja feita devagar e sem grandes espetáculos. A vida é muito curta para viver o que a gente não quer. E apenas nós podemos mudar o que não estamos gostando, ninguém mais tem esse poder…
Abraços e muito sucesso 🙂
deABREU
“Se mesmo depois de anos as tarefas ou responsabilidades continuam as mesmas, por que o salário deveria mudar?”
inflação, aumento de qualidade, aumento de importância, aumento oferta de outra empresa. só pra citar motivos que vêm à mente na hora.
ligiafascioni
Oi, deABREu!
Como já tentei esclarecer nos outros comentários, inflação se corrige com reajuste, não com aumento. São duas coisas absolutamente diferentes. Aumento de qualidade eu não entendi muito bem (seria competência?), assim como aumento de importância (?) – para quem? Já oferta de outra empresa é realmente um caso a considerar – se a pessoa é tão brilhante assim, aí é quem paga mais mesmo. Mas aí a pessoa deve ter recebido o convite de outra empresa; não era o caso citado na coluna.
Abraços e boa sorte!
Alessandro
Oi Lígia!
Concordo com o disse quando fala que se o sujeito não agregou nada em seu trabalho por dois, porque haveria de merecer aumento, porém, gostaria de levantar um ponto de vista aqui: será que o sujeito não ficou esperando uma oportunidade dada a ele de mostrar/provar seu valor, mas que nunca aconteceu? De fato, se o sujeito não evolui, não oferece mais, não há porque argumentar aumento de salário. Agora, parece uma “trava” que as empresas praticam com alguns funcionários, não os deixando ir a frente em suas carreiras, simplesmente porque eles “são bons no que fazem e se precisa que fiquem exatamente onde estão”. Desculpe, tenho exemplos pessoais justamente de situações como a que expôs aqui, e os fatos que posso apurar, me levam a concluir que: se a empresa não quiser que você progrida, você não vai progredir, consequentemente, isso justifica sua impossibilidade de negociar qualquer reajuste. Você fica de pés e mãos atadas, porque muitas vezes você gosta do que faz, mas tem uma “trava” na sua vida…. A saída? procurar outro emprego, mudar de setor…
Em todo caso, mais um belo artigo!!!
ligiafascioni
Oi, Alessandro!
Mas se a empresa não quer que a pessoa evolua e ela quer o contrário, não pode ficar “esperando” uma oportunidade. A vida é muito curta para esperar. Ou a pessoa cria a oportunidade ou então….cria a oportunidade. Seja na empresa ou em qualquer outro lugar. O que não dá é para colocar a responsabilidade da evolução da carreira da gente nas mãos de terceiros e depois reclamar que o terceiro não está interessado. Nós somos os únicos interessados na nossa carreira; temos que fazê-la andar.
Há algumas décadas, mudar de empresa ou setor era um sacrilégio; hoje é prática comum. É bom as empresas ficarem ligadas….
Abraços e sucesso!!
mari
Estou acompanhando as suas postagens. Tenho gostado bastante. Um abraço, Mari.
ligiafascioni
Que legal! Também estou amando seu Instagram 🙂
Outro abraço, Mari <3
Aldo Rocha
Discordo completamente do POST, vou argumentar utilizando a “hierarquia das necessidades” proposta por Maslow, tentarei não me estender muito no comentário.
Saiba que todo profissional busca o alto dessa pirâmide, que é a REALIZAÇÃO PESSOAL, creio que até você mesmo com esse tipo de pensamento exposto no texto busca isso, antes do topo as necessidades mais básicas devem ser satisfeitas, e o salário faz parte do degrau que proporciona a SEGURANÇA.
Se o profissional está fazendo seu trabalho melhor do que poderia ser feito, tem buscado qualificação e isso tem influenciado em seu desempenho, ele tem todo direito de exigir uma contra partida da empresa (nesse caso o aumento), isso se chama prova de RECONHECIMENTO, e todos nós precisamos.
O seu post vai de encontra todas as questões relacionadas à retenção de talentos.
Fico imaginando você como uma empresária e aquele seu funcionário super talentoso lendo isso. Diga isso ao profissional que está no auge de sua motivação, que faz a diferença na empresa, que tem ideias que aperfeiçoam e causam a evolução de seu produto ou serviço que: ele é um ótimo profissional, tem ideias maravilhosas, mas atuando como ele “só faz aquilo” o não vai ter aumento tão cedo, apenas o reajuste do sindicato.
Sinceramente, o que acontecerá é que no próximo mês virá outra empresa que valoriza o funcionário e “rouba” esse talento de você, simples assim.
ligiafascioni
Oi, Aldo!
Obrigada por discordar (isso é sempre saudável) e com tanta educação (mais saudável ainda)…rsrsrs
Só não entendi qual o ponto da discordância. O profissional que você descreveu é motivado, tem ideias que aperfeiçoam e causam evolução no seu produto, é um ótimo profissional, então com certeza ele pode assumir mais responsabilidades na empresa. É claro que merece aumento! Se eu fosse empresária e tivesse um funcionário assim, com certeza iria me reunir com ele e iríamos discutir juntos quais as novas atribuições dele para gerar mais valor (e, claro, com mais atribuições e responsabilidades, o contrato teria que ser alterado).
De fato, não entendi a discordância…
Abraços e sucesso!
Aldo Rocha
Me desculpe se pareci rude, o texto escrito tem dessas armadilhas, saiba que não foi a intenção. Li seus argumentos aos outros posts o qual deu “uma equilibrada” em seu texto, mas o teor do texto na íntegra sugere que todo o porteiro “vai morrer porteiro”, e sabemos de histórias de pessoas que começam em tal cargo e depois NA MESMA empresa, assume uma diretoria por exemplo.
Ao ler seu texto senti que você quis dizer que, vou utilizar agora da frase de uma colega que mostrou-me tal texto: “temos que ser igual ao flamingo, fica com o pé na lama, mas não se suja”.
ligiafascioni
Você não pareceu rude não, Aldo!
Mas é que realmente não entendi a discordância. Você acabou de citar o exemplo de um porteiro que assume a diretoria da empresa. Obviamente o contrato e as responsabilidades de um porteiro são diferentes das de um presidente; por isso, o contrato e o salário têm que ser diferentes.
Eu quis dizer que um porteiro “vai morrer porteiro” se ficar sempre fazendo a mesma coisa. Se ele tiver ideias, se assumir mais responsabilidades, claro que vai mudar de cargo e de salário.
Talvez eu não esteja sendo suficientemente clara com o “fazer a mesma coisa”. Duas pessoas podem ter o mesmo cargo de vendedor e, por causa da atitude profissional, terem funções e responsabilidades diferentes. É claro que aquele que se limita apenas a vender, vai ficar para sempre reclamando da vida e do salário. Já outro, no mesmo cargo, pode ter ideias, assumir algumas responsabilidades a mais (como fazer o pós venda ou sugerir novas maneiras de atrair clientes). O segundo tem muito mais probabilidade de ser promovido e ganhar aumento, claro! É disso que estou falando: para ganhar aumento, é preciso fazer mais do que está no contrato (que, no caso do vendedor é vender).
Tenho uma amiga que virou gerente porque passou a organizar e controlar o estoque por conta própria, já que ninguém se preocupava com isso (não era a “sua função”). Ela também começou a fazer relatórios analisando os produtos mais vendidos e suas conexões com os comentários dos clientes. Ela ganha quase o dobro que os outros, que ficam choramingando que não ganham aumento. É disso que estou falando, entende?
Espero que agora tenha ficado mais claro já que desconfio que, no fundo, não discordamos em nada….rsrsrsrs
Abraços,
Aldo Rocha
“Eu quis dizer que um porteiro “vai morrer porteiro” se ficar sempre fazendo a mesma coisa.”
Aí sim, aqui faz todo sentido.
Confesso que pequei na interpretação. Obrigado por dispensar o tempo e esgotar a explicação de seu ponto de vista.
Não discordamos mesmo 🙂
ligiafascioni
Aahahahah… eu sabia 🙂
Érica Martins
Lígia, opinião é opinião, cada um tem a sua, mas convenhamos que os tipos de argumentos utilizados aqui são fracos, medianos e sem fundamento nenhum. Primeiro: você conseguiria trabalhar 2 anos num mesmo lugar sem receber aumento? Visto que com o tempo suas atividades e responsabilidades vão aumentando, óbvio!!! Segundo: para o sindicato, você é só um cargo. Existem profissionais e profissionais. Vamos usar como exemplo o cargo de jornalista. O salário do Bonner é o mesmo do Mário Motta? Não. E eles estão numa mesma categoria, certo? Não é o sindicato que sabe a sua importância dentro de uma empresa. Terceiro: sabia que ouvir a conversa alheia é falta de educação, etiqueta ou seja mais lá o que for? Ao iniciar a leitura do texto, todo restante já perdeu o crédito. Da cabeça de qual ditador você tirou a infeliz ideia de que motivos pessoais não são relevantes para que se peça aumento? Quem sai todos os dias para trabalhar não são mães, pais e estudantes? Ou a partir do momento em que entram nas empresas viram robôs e suas famílias deixam de existir? Afinal, não é por eles que se levanta todos os dias? Enfim, não quero me estender demais, mas não vejo argumentos capazes de serem fundamentados de modo a formar uma opinião clara e coerente.
ligiafascioni
Oi, Érica!
É claro que as pessoas podem ter opiniões diferentes e devem ser respeitadas. Mas penso que devo alguns esclarecimentos a você, uma vez que sua resposta acabou confundindo um pouco os conceitos (provavelmente não fui suficientemente clara).
O primeiro esclarecimento é em relação a técnicas de redação. Uma das técnicas que os cronistas se utilizam para se conectar com o leitor e tornar o texto mais interessante é criar alguma situação do cotidiano em que ele se reconheça. Isso quer dizer que a cena descrita não necessariamente aconteceu – ela foi criada a partir de uma série de comentários que ouvi por aí, inclusive nas redes sociais. Se bem que às vezes as pessoas falam tão alto que é impossível não ouvir (talvez seja esse mesmo o objetivo de quem está falando tão alto). De qualquer maneira, como não citei nomes, não vejo problema, mesmo que tivesse, de fato, acontecido. Obviamente não funcionou com você (nem sempre funciona), mas vamos adiante.
Penso que talvez a introdução a tenha irritado a ponto de contribuir com alguma confusão no entendimento dos conceitos (que, é importante ressaltar, não fui eu que inventei). É clara a confusão entre aumento (que significa alteração contratual por conta da mudança no escopo do contrato de trabalho; também conhecido por promoção) e reajuste (incremento no salário para cobrir as perdas da inflação – não existe nos países onde não há esse fenômeno da economia).
E sim, já trabalhei mais de dois anos ganhando apenas reajustes (o chamado dissídio da categoria) porque minhas atribuições, responsabilidades e, consequentemente o contrato de trabalho não mudaram nesse período. Normal, não dá para ser promovido todo ano, né?
Vi que a coisa ficou confusa quando você mesma citou um exemplo que corrobora justamente meus argumentos no texto. É claro que o salário do Bonner e do Mário Motta são diferentes; eles têm funções e responsabilidades distintas. Além disso, elas mudaram ao longo da carreira de ambos.
Quando o Bonner apresentava o jornal local, ele tinha um contrato e ganhava um salário. Aí, recebeu a incumbência de apresentar o jornal nacional (mais responsabilidade, mudança no contrato, mudança de salário, claro). Depois, ele assumiu como editor geral (mais responsabilidade, mudança de contrato, aumento de salário). O Mário Motta é a mesma coisa; quando ele apresentava o programa como repórter, tinha um contrato e ganhava um salário. Aí foi para o jornal do almoço, assumiu mais responsabilidades, o contrato teve que ser mudado e ele ganhou aumento, claro.
Enfim, o que quero dizer é que para justificar um aumento de salário, é preciso que o escopo que descreve as funções da pessoa no contrato tenha mudado. Lamento, mas não inventei isso não, você pode checar com qualquer especialista em RH de qualquer empresa.
Por último, queria fazer uma pergunta: você já deu emprego alguma vez na vida? Já contratou uma pessoa, mesmo que tenha sido sua diarista? Você deu aumento para ela (real, com aumento de responsabilidades) ou apenas o reajuste do salário mínimo previsto? Essa experiência é muito enriquecedora. Os horizontes se ampliam muito quando a gente troca de lado e começa a ver as coisas sob outro ponto de vista.
Só para pensar, ok?
Desculpe uma resposta tão longa.
Abraços e sucesso!
Érica Martins
Sou formada em Letras – Língua Portuguesa e Literaturas de Língua Portuguesa e, modéstia à parte, sou muito boa em gêneros textuais. 😀 Como não se tratava do Luís Fernando Veríssimo, não fiz uma associação de cara com uma crônica, que deixou de ser crônica no primeiro parágrafo, certo? Rs. Mas voltando ao tema do seu texto, a grande questão é: ao longo de sua carreira, mesmo você fazendo a mesma (coisa) pela qual foi contratada, você adquiriu experiência, não? Isso não conta? Você faz a mesma coisa? Sim, mas em um tempo bem menor e com melhor qualidade!!! Se não fosse assim, por que uma empresa oferece treinamentos, cursos etc (qualquer pessoa que se qualifica vai querer ser reconhecida) E como se faz pra reconhecer esse profissional? Com beijo e muito obrigada? Desculpe, Lígia, mas não rola.
ligiafascioni
Ahahahaah… desculpe, Érica, a intenção não foi dar aula de técnicas de redação não (nem tenho competência para isso), mas é que não dá para levar tudo que a gente lê ao pé da letra. Não é uma crônica (na verdade, não sei bem a diferença entre os gêneros), mas há espaço para esse tipo de coisa (pelo menos acredito que sim)….
Claro que se adquiro experiência e faço mais coisas em menos tempo com maior qualidade, mereço um aumento. A única coisa que estou advogando aqui é que isso precisa aparecer no contrato de trabalho; se você faz mais do que fazia quando o contrato foi assinado, é claro que isso precisa ser renegociado, em nenhum momento disse o contrário. Voltando ao caso dos cursos: se no começo eu tinha pouca experiência e dava dois tipos de cursos, meu preço era um. Se agora o público é maior e estou oferecendo cursos sobre outros assuntos, naturalmente o que estou fazendo é diferente do que fazia no início e isso precisa ser reconhecido no contrato de trabalho. Profissionais que fazem mais, ganham mais, claro. Aliás, é isso que estou repetindo exaustivamente o tempo todo.
Ocorreu-me que talvez a discordância esteja no significado o termo “mesma coisa”; eu leio os seus exemplos e não consigo ver onde está a diferença entre o que você e eu estamos falando. “Mesma coisa”, para mim, significa exatamente igual: mesmas tarefas, mesmas responsabilidades, mesmo desempenho. Mas em todos os seus exemplos você cita pessoas que não estão, de maneira alguma, fazendo “a mesma coisa”. Você sempre fala que elas estão melhores, adquiriram mais experiência e assumiram mais responsabilidades. Isso, para mim, não é continuar fazendo exatamente “a mesma coisa”. É claro que em todos os casos em que você citou, as pessoas merecem um aumento, pois não continuam fazendo “a mesma coisa”; garanto que elas se sentirão muito mais reconhecidas profissionalmente se essa evolução constar no contrato de trabalho como justificativa para o aumento, em vez do patrão dizer que ele resolveu abrir a mão porque a pessoa está precisando muito e ele é bonzinho…
Quanto a você continuar discordando, normal. Cada um, cada um, é isso que torna o mundo tão interessante. Mesmo assim fico grata pela sua paciência em discutir (era bem mais fácil sair me xingando por aí como a maioria que discorda faz). É sempre bom trocar ideias com gente inteligente e educada.
Abraços e sucesso!
Marcos Sodré
Boa noite Ligia, tudo bem?
Acreditando que mesmo após bastante tempo desta publicação, você ainda possa retomar o assunto e clarear os pensamentos e caminhos a seguir de um profissional de comunicação ao solicitar um aumento. Sou paulistano, marido, pai de dois filhos, bacharel em Designer Gráfico com mais 23 anos de atuação na área da propaganda e publicidade, hoje exercendo o cargo de Creative Planner, há 8 meses, de uma empresa de T.I. (primeira vez que saio dá área das agências de propaganda) do interior do Paraná. Recentemente fui chamado para uma recontratação, alteração do contrato inicial porém somente com novas responsabilidades que foram detectadas a partir da minha pró-atividade em gerar mais valor para a empresa. Porém sem aumento salarial algum. (desmotivação 01). Ao indagar sobre o fato, recebi a resposta de que estaria participando de um programa de bonificação avaliado em 3 meses (desmotivação 02). Os 3 meses encerraram-se e, como sempre, fui atrás pra saber o resultado e, para minha surpresa, soube que os analistas não conseguem chegar num formato que possa mensurar meu trabalho, por tratar-se de propriedade intelectual. Muito intangível e completamente fora dos formatos de empresas de T.I. (desmotivação 3, 4, 5 e 6)
Minha motivação caiu demais. Mesmo amando o que faço e gostando de estar colaborando cm esta empresa e, como tbm não tenho experiência com as políticas das empresas de T.I., não sei o que fazer, como agir. Teria alguma opinião que pudesse ser significativa para que eu possa ao menos estudar a viabilidade? Se for um convite pra ser um colaborador em Berlim eu e minha família estamos aceitando na hora! 😀
Agradeço a atenção e sua publicação que vem servindo muito bem para minha reflexão.
Cordialmente
Marcos Sodré
ligiafascioni
Oi, Marcos!
Puxa, não sou especialista no assunto (o ideal seria ter alguém de RH aqui na discussão), mas a primeira coisa que me vem à mente é começar a mandar currículos para outros lugares. Porém, sei que o país está em crise e, pelo que você descreveu, gosta do trabalho, da equipe e da empresa. Então, fiquei aqui pensando o que eu faria se estivesse no seu lugar (é apenas o que eu faria, não é um conselho profissional, ok?): eu tentaria achar uma solução por minha conta. Pesquisaria como as outras empresas conseguem resolver essa questão da remuneração e progressão profissional e montaria uma proposta objetiva, que até poderia beneficiar outros profissionais na mesma situação que você. Mais proatividade que isso não há….rsrs… se depois de entregar a solução para eles de mão beijada e ainda assim não adiantar, aí, realmente, é hora de começar a pensar em olhar outras oportunidades, pois não vejo futuro. Por outro lado, se eles valorizarem sua iniciativa, pode até ser que role uma mudança de cargo para algo mais estratégico. Enfim. Não sei se ajudou, mas mande notícias!!! Sucesso e boa sorte!
Marcos Sodré
Oi Ligia.
Obrigado pelo retorno e sim, você ajudou muito a mostrar que estou no caminho certo. Buscar uma solução por minha conta é exatamente o que estou fazendo. Sendo bem franco, sempre escolhi traçar este caminho, o meu caminho pra solucionar problemas. Buscar a sua orientação foi uma das medidas que tomei pra construir esta proposta.
Agradeço imensamente pela atenção e ajuda.
Assim que eu obtiver um feedback deles, te dou um retorno sobre o ocorrido.
Mais uma vez obrigado.
Marcos Sodré