Eu fiquei sabendo de “Orbital”, de Samantha Harvey, porque vi uma entrevista com a jornalista Cora Rónai dizendo que foi o melhor livro que ela leu esse ano. Além disso, o livro também ganhou o prêmio Booker Prize do ano passado. Comprei, claro!
Orbital é a história de 6 pessoas embarcadas numa cápsula espacial orbitando ao redor da Terra: 4 astronautas e 2 cosmonautas (que são como os russos chamam os astronautas).
São 4 homens — Anton e Roman (russos), Shaun (americano) e Pietro (italiano); e 2 mulheres — Chien (japonesa) e Nell (britânica).
Eu adoro livro que já começa com mapas para explicar parte do contexto; esse abre com um mapa mundi com as 16 órbitas que o módulo faz todo dia ao redor do planeta. Isso significa que a tripulação vê o sol nascer e se por 16 vezes por dia. A pergunta sobre que horas são, a definição do que é dia ou noite — tudo isso é definido aleatoriamente, baseado em algum critério.
Isso faz a dinâmica da equipe ser bem diferente do que seria em terra. Sem falar na falta de gravidade, na água reciclada que eles consomem (inclusive da própria urina), da comida industrializada, do espaço reduzido e da necessidade de fazer horas de exercício físico artificialmente pesado para não perder rapidamente os músculos e, consequentemente, os ossos.
Cada integrante tem suas pesquisas e tarefas específicas de pesquisa, com camundongos, placas de células, sementes e plantas. Além disso, eles próprios também são cobaias de como os seres humanos se comportam nessas condições atípicas e análises de amostras de sangue são enviadas diariamente à equipe de terra.
Eles estão acompanhando (enviando fotos e vídeos em tempo real) um super tufão que se aproxima das Filipinas e Malásia. A vista da cápsula deve ser surreal; eles conseguem ver o tufão se formando e precisam esperar outro dia para ver como ele evolui. Também conseguem ver a aurora boreal algumas vezes, as nuvens, os oceanos e as luzes das cidades durante as noites.
O contato com a terra é diário, inclusive com redes sociais; eles trocam mensagens com a família como se estivessem na cidade ao lado. A maioria é casada e alguns têm filhos.
A questão do tufão é bem angustiante, pois Pietro passou a lua de mel nas Filipinas e fez amizade com um pescador, com quem ele continuou a manter um relacionamento a distância, a ponto de pagar os estudos das crianças. Ele oferece ajuda para que o pescador fuja com a família, mas a solução é mais complexa — eles não têm para onde ir e decidem ficar e esperar o que acontece.
Apesar de histórias e culturas diferentes, em comum todos sonhavam ser astronautas desde crianças, e de alguma forma lembram de seus pais falando do primeiro pouso na Lua. Enquanto estão no espaço, outra equipe se prepara para ir até o satélite depois de tantos anos — e dá para sentir uma pontinha, senão de inveja, de admiração e vontade de estar lá.
A mãe de Chien morre enquanto ela está em órbita (eles vão ficar 9 meses dando voltas) e ela compartilha a dor com os colegas.
Apesar de viverem enclausurados e de maneira tão próxima e por tão pouco tempo, eles parecem não desenvolver muita intimidade. Todos mantém uma distância respeitosa e, para mim, que sou brasileira, um tanto estranha.
A verdade é que a autora consegue traduzir bem as angústias existenciais dos personagens, a rotina monótona e sem grandes novidades, a coragem e os sonhos de cada um — todos parecem ser seres humanos dignos e honestos.
Mas jamais diria que esse é o melhor livro que li esse ano (acho que nem nesse mês). Para mim, o problema é que, apesar da escrita impecável, do trabalho de pesquisa perfeito e do cuidado em cada descrição, não tem história.
Nada acontece, nem ao menos algum conflito entre os membros da tripulação. Nenhum grande problema para resolver, nenhum imprevisto, nenhuma falha de caráter, nenhuma emergência, nada.
Só seres humanos normais, encapsulados no espaço, de certa forma realizando seus sonhos, mas totalmente chatos (pelo menos para mim).
Sei lá, mas para mim faltou tempero. Não dá nem para dizer que é ruim, pois não tem gosto. Uma ideia sensacional, mas, na minha opinião, mal explorada…
A Cora leu a versão em português, então com certeza tem tradução. Para quem quiser formar sua própria opinião (por favor!), é só clicar nesse link da Amazon do Brasil e garantir seu exemplar.

