Sim, admito, confirmo e repito: eu julgo o livro pela capa. E dificilmente erro. No caso de “Mr. Peardews Sammlung der Velorenen Dinge”*, de Ruth Hogan, a capa traduziu exatamente o espírito da obra e o que eu esperava dela.
Achei o volume num mercado de pulgas e o resumo me interessou principalmente pela ideia (ótima). Tal qual a capa, a história é um pouco kitsch e cheia de clichês; final previsível, personagens estereotipados e estrutura convencional. Mesmo assim, gostei de tê-lo lido, uma vez que não criei falsas expectativas.
Mas vamos à parte interessante: um escritor perde sua noiva pouco antes do casamento. Ela tinha lhe dado um medalhão de presente, como agradecimento pelo jardim de rosas que ele construiu na casa onde iriam morar. Só que no dia da morte de sua amada, ele acaba perdendo a peça. Fica inconsolável e acaba adquirindo o hábito de recolher objetos encontrados aleatoriamente.
Ele registra a data e o local em que cada coisa foi descoberta e guarda tudo em gavetinhas no seu escritório. Tem de tudo: cinzas de cremação achadas dentro de uma latinha de biscoitos dentro de um trem, um enfeite de cabelo que estava numa praça, um guarda-chuva estampado com coraçõezinhos ao lado de uma estátua, uma xícara de porcelana deixada sobre um banco de praça, etc.
O autor imagina uma história para cada objeto; e essa é finalmente a parte genial do livro. As histórias são sensacionais! Criativas, inusitadas, bem-escritas. A melhor, na minha opinião, foi uma peça de quebra-cabeças que estava abandonada na calçada, contando a relação conflituosa entre duas irmãs de meia-idade.
Ele publica essas histórias em vários volumes, mas seu sonho é poder devolver cada peça para seu verdadeiro dono. Ele acredita que assim vai conseguir, de alguma maneira, merecer a recuperação do medalhão perdido.
Eis que o escritor morre e deixa a casa, todos os seus bens, e a coleção de objetos para Laura, sua secretária/diarista; uma moça comum e absolutamente sem graça que tem uma queda pelo jardineiro. Imagine uma Amélie Poulain (a história me remeteu muito a ela), só que sem a criatividade, o humor e o carisma da francesinha. Tudo isso com toques sobrenaturais. Pois é.
O volume é bem escrito e amarrado; uma pena as platitudes de filme de seção da tarde, mas não chega a ser desagradável. Se a autora publicasse somente as historinhas de cada objeto, eu iria gostar muito mais, com certeza.
De qualquer maneira, recomendo como passatempo.
*A tradução livre do título em alemão é “Coleção de coisas perdidas do Sr. Peardews“, o que achei péssimo. Principalmente se a gente considerar que o original em inglês é “The keeper of lost things“, que poderia ser traduzido como “O guardador de coisas perdidas“; muito mais interessante.
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