Simples assim

Estou tendo que atualizar várias imagens que foram perdidas por conta da importação do blog antigo e acabei relendo algumas colunas. Vou repostar algumas, como a que segue, publicada em julho de 2008 (está no meu livro “O design do designer“).

Nesse feriado de Páscoa, fui visitar a família e passei pelo aeroporto de Guarulhos (surpreendentemente calmo). Foi com o movimento baixo que me dei conta do ruído visual daquilo tudo. Eles indicam que o seu portão de embarque é o de número 15, no terminal 2, setor doméstico, asa C. A sinalização é feita por placas bilíngües, densas e confusas. Afinal, se só há um portão número 15 em todo o aeroporto, para que as outras informações? Esse desperdício conceitual me fez lembrar John Maeda.

Maeda é um cara cheio de talentos. Designer gráfico, artista e professor de Media Arts & Sciences do legendário MIT (Massachussets Institute of Technology), ele também fundou o MIT Simplicity Consortium no Laboratório de Mídia. O consórcio é constituído por dez sócios corporativos, incluindo a Lego, a Toshiba e a Time, e tem a sublime missão de definir o valor comercial da simplicidade nas comunicações, na assistência médica e nos jogos. Sua equipe projeta e cria tecnologias para o desenvolvimento de produtos orientados à simplicidade.

Estudando a fundo a questão da simplicidade, ele descobriu que, no ramo da tecnologia, quando se desenvolve uma coisa nova e aprimorada, esse “aprimorada” significa simplesmente “mais”. Indo ainda mais a fundo, Maeda elaborou as Leis da Simplicidade, descritas no livro de mesmo nome, publicado pela Editora Novo Conceito. Vamos a elas:

1. Reduzir: Essa lei determina que se deve acabar com a crença de que botões em profusão atraem compradores. A Apple está aí para provar o contrário, conseguindo construir um telefone celular sem botões! A filosofia por trás do conceito é que se boas peças podem fazer um grande produto, peças incríveis (e poucas), podem transformá-lo numa lenda. Mas é preciso cuidado e discernimento para decidir o que fica e o que sai. Em design, menos é melhor.

2. Organizar: Os seres humanos são animais organizacionais, que tendem a agrupar e categorizar tudo que vêem. Se a gente faz isso até com pessoas (Fulano é chato, Beltrana é bonita, Sicrano é contador), imagina com objetos e informações! Assim, tabulações, espaçamentos, endentações e organização clara das funções e informações é fundamental.

3. Economizar tempo: Maeda diz que quando somos obrigados a esperar, a vida nos parece desnecessariamente complexa. E quando acelerar um processo não for uma opção, tornar a espera mais tolerável pode fazer a diferença. Uma coisa é você esperar um vôo por três horas numa sala VIP tomando chá com torradas e assistindo a um bom filme em um sofá confortável. Outra é ser supliciado por 45 minutos em pé num saguão de aeroporto lotado, ruidoso, frio e cheio de gente mal-humorada. O tempo de espera pode ser menor, mas a percepção…

4. Aprender: O conhecimento torna tudo mais simples e rápido. Assim, o desafio do bom design reside, de alguma maneira, na capacidade de instigar um sentido de familiaridade instantânea do tipo “ei, eu já vi isso antes!”, ao mesmo tempo que surpreende o usuário. Para isso, as metáforas são imbatíveis. O fato é que tudo aquilo que é difícil de usar, também é difícil de aprender. Quanto mais grosso o manual de instruções, mais longe do bom design.

5. Diferenciar: Uma constatação da vida – ninguém quer apenas simplicidade. Sem o contraponto da complexidade, não podemos reconhecer o simples quando o vemos. Assim, a simplicidade e a complexidade necessitam uma da outra. O ideal é que a complexidade esteja disponível e acessível para quem queira dela usufruir. É o famoso “clique aqui para saber mais” no nível conceitual.

6. Contextualizar: Aqui, o desafio é descobrir o quanto se tem que focar e o quanto se tem que generalizar. Localizar alguém no tempo e no espaço ajuda a criar uma sensação de conforto e colabora para a nossa ânsia de organização.

7. Emocionar: Mais emoções é melhor que menos. Senão, por que depois que as pessoas são atraídas para a simplicidade de um aparelho, logo correm para comprar acessórios? Meninas escolhem roupinhas para as suas Barbies; executivos compram capas para iPods e celulares. Então, dê um desconto para a simplicidade. Talvez os humanos não sejam tão simples. Atingir a clareza não é difícil; difícil é atingir o conforto.

8. Confiar: Aqui são tratadas as questões onde o sistema pode decidir em seu lugar para tornar a sua vida mais simples. Por exemplo, você pode entrar num restaurante e escolher o prato do dia, mesmo sem saber do que se trata, pois confia no cozinheiro. O site de notícias mostra apenas as novidades do seu interesse, de acordo com o seu perfil. Sites de relacionamento podem escolher o par ideal para você. O problema é que a confiança pressupõe reciprocidade. Essas escolhas são tanto mais confiáveis quanto mais o sistema conhecer você. É um caso de privacidade versus conforto.

9. Fracassar: Até mesmo o John Maeda admite – algumas coisas nunca podem ser simples. Para fazer o simples, necessita-se do complexo. A rede complexa de servidores e algoritmos do Google é que fazem com que a sua experiência de busca seja simples. Neste ponto, ele faz uma admirável auto-crítica das suas leis. Mais o que simplicidade, lucidez é fundamental.

10. A única: Essa lei pretende substituir todas as anteriores e é de uma simplicidade aterradora – a simplicidade consiste em subtrair o óbvio e acrescentar o significativo.

Se você, como eu, também se encantou pelo assunto, acompanhe os estudos de John Maeda em http://lawsofsimplicity.com.

Lígia Fascioni | www.ligiafascioni.com.br

Fé demais

Terminei de ler “A janela de Euclides“, do Leonard Mlodinov (já falei do livro aqui) e continuo recomendando o volume. A segunda parte explica a essência do espaço curvo, a teoria da relatividade e teoria das cordas (atual teoria M) de um jeito que dá para nós leigos termos uma vaga noção do tamanho da encrenca. Sobre o espaço curvo eu já tinha escrito aqui, então o que quero compartilhar é uma historinha meio bizarra que achei no livro, olha só.

Na Idade Média, o cristianismo impediu qualquer progresso da ciência, condenando todo mundo que pensava demais; foi aí que o poderoso imperador romano Carlos Magno, apesar de católico fervoroso, se deu conta de que, naquele marasmo intelectual não dava para continuar. E se tornou o maior mecenas da educação na época, apesar de analfabeto (ele tentou aprender a ler várias vezes, mas parece que não conseguiu).

A limitação não o impediu de construir escolas paroquiais e transformar mosteiros em centros de estudo. Essas escolas foram se espalhando sem controle até que acabaram contribuindo muito para o fim da Idade das Trevas, como aquele período nesfasto para o conhecimento humano ficou conhecido.

A parte engraçada é que Carlos Magno, como a maioria dos reis poderosos, preocupava-se muito com sua saúde e longevidade. Tendo os melhores médicos, alquimistas, pesquisadores e estudiosos do mundo inteiro ao seu inteiro dispor, sabe o que ele fez?

Pasme: construiu mosteiros e contratou centenas de monges e leigos para rezar fervorosamente por ele em três turnos diários, numa espécie de fábrica teológica.

É mole? Mas parece que o pessoal matava um pouco o serviço, pois ele morreu bem doente, aos 72 anos…

Vaidade de ser

Nossa, fiquei bem confusa quando vi essa placa com o slogan de um curso de formação de executivos: “Vaidade de ser, orgulho de fazer“. Será que o que entendo por vaidade tem, na verdade, outro sentido que desconheço? Fui no dicionário Aulete e vi que não, era isso mesmo. Ora, temos aqui um belo problema de identidade corporativa.

Como é que uma empresa que promove a formação de executivos sustenta-se sobre um pilar baseado na vaidade? Vaidade quer dizer valorização exagerada dos próprios atributos; qualidade ou condição do que é vão, fútil, ilusório; vanglória, ostentação.

Mesmo no sentido mais light, o de preocupação com a própria aparência por desejo de ser admirado, poderia até ficar bem num salão de beleza. Mas, cá entre nós: num programa de formação de executivos?

Só posso dizer que fico bem preocupada com o tipo de profissional que pode sair de um lugar assim…

Mel e flores

A gente sempre associa a ideia de mel com polen e flores, não é? Pois o studio de design londrino The Partners levou essa ideia até as últimas consequências, e olha só que resultado show: a embalagem é reutilizável e se transforma num vaso de cerâmica, em que a tampa vira pratinho, fazendo com que a embalagem continue a fazer parte do ciclo de vida do produto, pois as flores geram polen para as abelhas.

Como é bem ver tanta gente inspirada tem nesse mundão prestes a se desintegrar…

Achei essa coisa linda lá no ótimo e recém-descoberto Marketing na Cozinha.

A invenção do benchmarking

Estou me deliciando com o ótimo “A janela de Euclides”, do Leonard Mlodinow, e fiquei surpresa com algumas descobertas interessantes.

O livro conta a história da geometria, das linhas paralelas e do hiperespaço de um jeito que mesmo quem não gosta de matemática vai curtir. As explicações dos princípios são bem amigáveis e o autor se debruça bastante sobre a história e o contexto do local onde viveram os homens que revolucionaram a nossa vida e permitiram que hoje seja possível escrever num computador e ser lido instantaneamente por trocentos milhares de viventes.

Começa com os gregos, fala de Euclides, Descartes, Gauss, Einstein e Witten, destacando a contribuição de cada um para que o conhecimento andasse para frente. Cada um desses merece uma resenha à parte, mas fiquei especialmente impressionada com Pitágoras (sim, aquele do teorema), lá na antiguidade clássica.

Leonard nos conta que a capacidade de abstração, muito necessária na matemática, veio principalmente da Babilônia e do Egito. Não que esse povo antigo tivesse um alto índice de nerds entre seus cidadãos que adoravam ficar fazendo contas; a necessidade veio da construção civil e, principalmente, veja só, da cobrança de impostos.

Foram necessários milhares de anos para o ser humano entender que o número 2, por exemplo, era uma entidade com vida independente e que não precisava ser necessariamente representado por figos, camelos ou tâmaras. Esse conceito era importante para medir áreas, terrenos, enfim, para fazer nascer a geometria (palavra de origem egípcia trazida para a Grécia por Tales de Mileto, inventor do primeiro sistema de raciocínio lógico). Geometria significa, literalmente, “medida da terra”.

Pois esse Tales, quando já era velho e famoso, recebeu a visita de um tal de Pitágoras, jovem muito promissor no assunto abstração, e aconselhou-o a ir ao Egito estudar. O rapaz foi e parece que era muito bom de networking, tanto que foi dos poucos estrangeiros que conseguiu aprender hieróglifos. Essa escrita era tão confidencial que Pitágoras foi iniciado nos ritos secretos e virou até sacerdote. Ficou lá por 13 anos, até que foi levado pelos persas como prisioneiro numa guerra. Esperto, na Pérsia aprendeu tudo sobre a matemática babilônica e só voltou à Grécia aos 50 anos, quando decidiu fundar uma seita.

Bom de marketing que só ele, usou seus conhecimentos sobre hieróglifos como diferencial; alguns gregos achavam que ele tinha poderes especiais de divindade. Como de bobo Pitágoras não tinha nada, alimentou muitas histórias que rolavam a seu respeito para atrair seguidores. E agora vem a parte realmente interessante.

Sabe o que se falava sobre Pitágoras, mais de 500 anos antes de Maria engravidar?

Há registros contando que um ladrão invadiu a casa desse nobre senhor e viu coisas tão estranhas que fugiu sem levar nada, recusando-se a dizer qualquer coisa a respeito. Antes de viajar para o Egito, Pitágoras viveu como eremita no monte Carmelo (igual à vigília solitária de Cristo, tá lembrado?). Há também outra história dando conta de que Pitágoras ressuscitava os mortos; diziam que ele aparecia em dois lugares ao mesmo tempo, podia controlar as forças da natureza e chegou, certa vez, a ser saudado por uma voz divina. O povo comentava até que ele chegou a andar sobre as águas, pode?

Pitágoras pregava em sua seita que se devia amar os inimigos e que os bens materiais atrapalhavam a busca da verdade divina… está acompanhando?

Dizia-se que Pitágoras era filho de Deus (no caso, o deus Apolo) e sua mãe se chamava Partene (que, em grego, significa “virgem”).

Pitágoras foi realmente um mito em seu tempo; toda a antiguidade conhecia seus feitos e poderes. Não poucos o idolatravam; um verdadeiro ícone.

Mais ou menos em 500 a. C., o matemático teve que fugir de Crotona, a cidade onde morava, por perseguição política. Há quem diga que ele se suicidou, mas algumas fontes relatam que viveu até os 100 anos. Já a sociedade pitagórica sofreu vários ataques e foi praticamente dizimada; só alguns poucos conseguiram escapar.

Pois é, quem diria? Por que não ensinam isso para a gente na escola? Essas coincidências incontestáveis de relatos antigos com histórias cristãs, para mim, revelam uma coisa: a igreja inventou o benchmarking*.

Isso é que é visão de mercado!

Lígia Fascioni | www.ligiafascioni.com.br

Eco pecados

Ilustração: Banski

O pecado é inerente ao ser humano e, desde que o conceito existe, temos convivido com a culpa como se fosse uma sombra; dependendo do sol, ela some, mas sempre volta. O povo apronta bastante, mas, quando sente que pegou pesado, corre atrás de salvação para sua alma atormentada na esperança de que alguém passe a mão na sua cabeça e diga que está tudo bem; nem foi tão mal assim, vai.

Empreendedora como sempre foi, na Idade Média a Igreja sacou que aí havia uma grande oportunidade de negócio e começou a vender pequenos pedaços de papel com o perdão escrito por sacerdotes autorizados. Em parte, o sucesso da prensa de Gutenberg se deu por essa “malinagem”, uma vez que quase ninguém sabia ler na época, mas todo mundo tinha pecados guardados nas gavetas e nos armários. O resultado é que descobriu-se que imprimir indulgências era o mesmo que imprimir dinheiro e o projeto foi um tremendo sucesso. Dizem alguns historiadores que essa foi a gota de tinta que faltava para que Lutero se revoltasse e consolidasse a Reforma Protestante. A coisa foi tão escandalosa que, depois de muita indulgência vendida, a Igreja achou por bem colocar fim nesse comércio de perdões, pelo menos oficialmente (como não freqüento nenhuma igreja, não sei bem como funciona hoje, então vamos deixar assim).

De qualquer maneira, os tempos mudaram, mas os seres humanos e, principalmente, seus pecados, continuam bombando. A diferença é que, como as pessoas estão menos pudicas e as leis dão conta dos crimes mais sérios, o grande pecado de nossa época é atentar contra a sustentabilidade do planeta. Simples como a tabuada de dois, todo mundo tem pelo menos algum grau de consciência de que, do jeito que a coisa anda, a gente não vai muito longe. O planeta está se desintegrando a olhos vistos e tudo por culpa da absoluta falta de educação de uma geração mimada que cresceu (e se multiplicou) achando que os recursos eram infinitos e que algum funcionário solícito iria aparecer do além para limpar a sujeira e deixar tudo em ordem de novo.

Então, crianças, quando a gente sabe que está fazendo alguma coisa errada, mas não quer mudar porque acha bom assim mesmo, faz o quê? Ressuscita da Idade Média a tal da indulgência, agora na versão empresarial na forma de créditos de carbono e na versão civil, na forma de camisetas engajadas, adesivos irados e biocombustível.

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Duplo sentido

Fotos de duplo sentido combinam surpresa, humor e um olhar original sobre o cotidiano. Um mestre nessa arte é o francês René Maltête (1930-2000), dono de um olhar apurado e especialíssimo. Como ficar indiferente a imagens assim? Olha aqui inspiração para esse meio de semana, aproveite!

Observador atento

Vai um regime aí?

Sereia urbana

Quer ver mais? Clica aqui na galeria que o filho dele mantém.

Pets on Furniture

O blog de decoração Desire to inspire, que frequento e adoro, tem uma seção chamada “pets on furniture” na qual a pessoa pode enviar fotos de seus fofinhos onde eles aparecem como parte da composição da decoração (ok, a descrição não é bem essa, mas o resultado final é exatamente assim). Como tenho quatro rapazes lindos e fotogênicos em casa, não resisti e mandei algumas fotos. Pois eles publicaram todas (claro, nossos gatos são praticamente modelos profissionais).

Aqui está o Heitor em um momento intelectual (só faltaram os óculos) que está bombando nos comentários. Clica aqui para ver o resto lá no site. Os gatos mais charmosos do post são todos nossos.